76% das vítimas de feminicídio sofrem perseguição um ano antes do crime, revela Ministério Público

2015-04-10_190211

Este e outros dados foram apresentados no lançamento da cartilha virtual “Todos e todas pelo fim da violência contra a mulher”

O Ministério Público do Rio Grande do Sul lançou na sexta-feira (25) uma cartilha digital sobre violência doméstica para alertar mulheres, fazendo com que elas procurem ajuda ao menor sinal de violência. O Lançamento fez parte da programação do seminário Violência Doméstica – Diálogos sobre a Lei Maria da Penha.
Durante o evento, foram apresentado diversos dados alarmantes: Por hora, 503 mulheres são vítimas de violência doméstica e familiar no Brasil; treze mulheres por dia são vítimas de feminicídios no país; a cada onze minutos, uma brasileira é estuprada;  um estudo realizado em dez capitais no Nordeste concluiu que 27% das mulheres já sofreram algum tipo de violência doméstica.
A cartilha lançada no evento é uma das estratégias de prevenção a esses crimes,
trazendo informações sobre as formas de violência de gênero física, moral e patrimonial, o ciclo de violência doméstica, além de informações sobre onde e como buscar ajuda.
A cartilha tem textos curtos e imagens positivas , a intenção é de que esse material seja compartilhado pelas redes sociais e aplicativos e o seu link será disponibilizado no Site da Gazeta.

Palestras
O primeiro palestrante do evento Violência Doméstica – Diálogos Sobre a Lei Maria da Penha, foi o ministro do Superior Tribunal de Justiça Rogerio Schietti Cruz. Oriundo do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios, o ministro é referência jurídica na área da violência contra a mulher.
Após ser apresentado pela coordenadora do Centro de Apoio Operacional de Defesa dos Direitos Humanos, Angela Salton Rotunno, Cruz falou sobre “A Lei Maria da Penha e a Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça”. Iniciou sua palestra lembrando o protagonismo do Ministério Público gaúcho em diversas questões, como, por exemplo, a iniciativa que deu origem à lei para minimizar os efeitos dos depoimentos de crianças e adolescentes vítimas de abuso.
Sobre o tema principal, falou da dificuldade de, como homem com uma formação patriarcal, tratar do tema em uma Instituição que tem como função interpretar as leis e criar diretrizes que sirvam para decisões futuras. “Estudamos, racionalizamos, mas a dor quem sente é a mulher”, disse, destacando que é um treino, uma reeducação diária. “O STJ é uma voz em favor dessa causa”, pontuou.
Conforme o palestrante, desde 2018, há um decréscimo de 20% nos casos de homicídio, mas um aumento nos feminicídios (4%) e violência doméstica (0,8%) e sexual (4%), o que, segundo ele, é um fenômeno mundial.
Rogerio Schietti Cruz apresentou a evolução da jurisprudência na interpretação e aplicação da lei Maria da Penha, inclusive com relação às mulheres transsexuais, as súmulas mais importantes do STJ à esse respeito e sobre violência sexual contra crianças e adolescentes, e as Resoluções do Conselho Nacional de Justiça envolvendo esses temas.
“A agressão a uma mulher traduz uma covardia que não pode ser tolerada, mesmo que não tenha marcas. Não mancha a pele, mas mancha a alma”, destacou Cruz.
Por fim, o ministro respondeu a diversos questionamentos enviados pelos participantes da plateia e lidos pela promotora-corregedora Carla Frós, que atuou como debatedora da mesa.

Medidas protetivas
De acordo com dados do CNMP, 76% das vítimas de feminicídio consumado e 85% das vítimas de tentativa de feminicídio haviam sofrido atos de perseguição nos 12 meses anteriores ao feminicídio. Ainda, 41% dos agressores voltam a praticar violência contra as vítimas no período de até 30 meses após um incidente anterior de violência doméstica. A maioria das mortes de mulheres ocorre em contexto de relacionamento marcado por violências anteriores.
Para tratar sobre as medidas protetivas, sua natureza jurídica e parâmetros decisórios, ocorreu o primeiro painel da tarde, com o promotor de Justiça do Distrito Federal e Territórios Thiago André Pierobom de Ávila. As debatedoras foram as promotoras de Justiça Ivana Machado Battaglin e Catiuce Ribas Barin.
Thiago de Ávila falou que a violência contra a mulher é uma epidemia e, portanto, um problema de saúde pública. “Somos o quinto país do mundo com a maior taxa proporcional de feminicídios. Ser mulher no Brasil é perigoso”, disse. E há grupos que apresentam risco ainda maior, já que a quantidade de assassinatos de mulheres negras é substancialmente maior – 66%, mesmo que correspondam a 51% da população feminina. A hipótese dele é que, para as mulheres brancas, a Lei Maria da penha é acessível, bem como as políticas públicas, mas as mulheres negras, normalmente nas classes mais baixas, têm dificuldades de acessar as políticas públicas.
Nesse sentido, Thiago de Ávila aponta que as medidas protetivas de urgência têm caráter cível e, nesse sentido, “se prestam a proteger direitos fundamentais; elas não protegem processos, elas protegem pessoas”. “Se eu coloco a proteção como algo criminal, eu diminuo a abrangência da proteção”, apontou. Segundo ele, as medidas têm caráter de proteção urgente, e não de punição do agressor. “Se a mulher registra uma ocorrência, se diz que sofreu uma violência, na dúvida, eu peço a proteção”, afirmou o promotor.
Em relação aos requisitos para solicitação, ele defende que a Lei Maria da Penha é um marco político na obrigação do estado brasileiro em ser eficiente em defender os direitos das mulheres. O palestrante citou uma pesquisa que apontou que, em 88% dos casos em que houve concessão de medida protetiva, não houve a reiteração de novos episódios de violência.

Promoção
O evento foi promovido pelo Ministério Público, por meio do Centro de Apoio Operacional dos Direitos Humanos, Corregedoria-Geral, Promotoria Especializada de Combate à Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher e Centro de Estudos e Aperfeiçoamento Funcional.