Haitiano agredido à marretada em obra, denuncia agressão e racismo

2015-04-10_190211

O encanador Adma Soliman, de 33 anos, conta que agressão aconteceu na última segunda-feira, dia 10, na obra em que trabalhava como encanador

 

“Foi a primeira vez na vida que passei por isso. Fiquei muito revoltado com isso, eu trabalho para comer, para ter coisas em casa, nunca roubei de ninguém e o cara vem me bater”. Esse é apenas um trecho do depoimento do haitiano Adma Soliman, de 33 anos, à Gazeta, que há 7 anos mora no Brasil. Soliman trabalha como encanador e denuncia que na terça-feira, dia 10, por volta das 14 horas, foi agredido por uma marreta de borracha no local de trabalho. O golpe teria sido desferido pelo mestre de obras. Ainda na terça-feira o encanador registrou um boletim de ocorrência, relatando todo o ocorrido e foi encaminhado para exame de corpo de delito.
“Eu estava fazendo parte do encanamento da obra. Acontece que eu cheguei para colocar uma mangueira para molhar o jardim. Quando eu fui pegar a medida da mangueira tinha um mestre de obra (agressor) e ele falou que eu tinha que cuidar do meu serviço. Ele faz parte da construção e eu do encanamento. Eu estava a um metro de distância do serviço dele e falei pra ele que eu iria cuidar e que não estava perto do serviço dele. Quando eu me virei ele pegou a marreta que estava batendo na pedra e com as duas mãos acertou na minha nádega. Como ele me bateu forte eu caí, e com a agressão perdi a cabeça e queria ir pra cima dele, mas o dono da obra me segurou”, conta.
Soliman que diz ter muitos amigos em Bento Gonçalves, e que ama o Brasil, lamenta o fato de que esse tipo de situação aconteça. De acordo com ele, já houve também episódios em que sofreu humilhação por conta da cor da pele.
“As pessoas têm que aprender que a cor das pessoas não justifica, não podem julgar as pessoas pela cor e te julgam porque é moreno ou preto. Eu tenho um outro colega que está me desprezando, me chama de preto desgraçado. Esse cara nem sabe escrever, eu falo cinco idiomas, e ele não sabe nem falar o português bem e fica me julgando por causa da cor. Eu já relatei essas agressões para um monte de gente e não aconteceu nada”, desabafa.
O apontado agressor, em declaração à Gazeta, pediu para não ser idenficado, mas rebateu as declarações e diz que o encanador está mentindo.
“Ele me atirou pedras e só discutimos, eu não ofendi ele, é informação inverídica. Ele estragou a minha ferramenta, eu fui reclamar com ele e ele me ofendeu, não teve agressão. Deixa ele falar o que ele pensa. Ele jogou pedras, se pega em mim um o meu amigo que está trabalhando junto não sei o que poderia ter acontecido. A agressão partiu por parte dele. Não publica nada, deixa ele reclamar”, sugeriu.
Um colega de trabalho de Soliman, que também optou por não se identificar, no entanto, confirma a versão dos fatos do haitiano. “Ele foi agredido por nada, ele bateu no Adma como se estivesse batendo numa madeira e seguiu trabalhando normalmente, não tinha motivo para agredir, eu estava perto, não tinha motivo. Parece que tinha batido numa árvore, numa madeira, ele deu uma marretada do nada. Não teve um ato de provocação”, diz.
A Gazeta entrou em contato com a empresa em que Soliman trabalha, porém, uma funcionária informou que a empresa não comentaria o caso.

Haitianos em Bento
No início da segunda década dos anos 2000 a região da Serra Gaúcha recebeu milhares de haitianos que buscavam um recomeço após os desastres que aconteceram no Haiti em 2010. A imigração haitiana no Brasil passou por vários momentos desde sua intensificação a partir de 2010, ano do terremoto que destruiu o próprio Haiti. De acordo com Ronal Dorval, presidente da Associação dos Haitianos de Bento Gonçalves, atualmente o município abriga cerca de 1300 imigrantes haitianos.
Em mais de sete anos, é estimado que mais de 90 mil haitianos entraram e se espalharam pelo país, enfrentando uma difícil trajetória, na condição de trabalhador imigrante, para sua inserção no mercado.
De acordo com um levantamento feito pela Organização das Nações Unidas (ONU), o Brasil é o país da região com maior número de haitianos. Até o fim de 2016, foram autorizadas 67 mil autorizações de residência no país, incluindo temporárias e permanentes. No Chile, foram concedidas 18 mil autorizações de moradia até o fim de 2015, enquanto na Argentina havia pouco menos de 1,2 mil.