Síndrome da feiura imaginária: saiba mais sobre a dismorfia corporal que acomete 2% da população

2015-04-10_190211
Um dos mais famosos que sofreu com o distúrbio foi o cantor Michael Jackson

A síndrome da feiura imaginária é uma dismorfia corporal na qual o acometido vê defeitos que não existem

Um grupo de psiquiatras desenvolveram um livro chamado Transtorno Dismórfico Corporal — A Mente Que Mente, que caracteriza um distúrbio que atinge 2% da população, só no Brasil cerca 4,1 milhões de pessoas passa pelo TDC que consiste em uma “preocupação exagerada com algum defeito imaginário em sua aparência física”, conforme explica o psiquiatra Táki Cordás, um dos escritores do livro. “O indivíduo pode achar que tem um nariz tão grande que, se sair às ruas, vai assustar todo mundo. Ou, então, ficar paranoico por acreditar que todos estão olhando para ele por causa do seu queixo ou da sua orelha”, exemplifica o escritor.

A valorização exagerada da aparência ganha cada vez mais adeptos, princialmente em razão das redes sociais, onde são cultuados corpos e vidas perfeitas. De acordo com os estudiosos, o distúrbio atinge homens e mulheres, principalmente entre 15 e 30 anos. O médico psiquiatra italiano, Enrico Morselli, descreveu a condição pela primeira vez em 1886, mas somente quase um século após, a Associação Americana de Psiquiatria, incluiu o TDC como um distúrbio no Manual Diagnóstico e Estatístico de Distúrbios Mentais.

O Manual, que é visto como um guia da psiquiatria expõe que o distúrbio de imagem faz com que a pessoa passe a se incomodar muito com uma pequena característica, seja ela uma pinta no rosto ou uma cicatriz na testa, em um nível que para sair de casa é necessário camuflá-la.  Muitas vezes, o incomodo exagerado é com algo que nem mesmo existe, como por exemplo uma barriga grande. De acordo com o psiquiatra Marcel Higa Kaio, do Núcleo de Atenção aos Transtornos Alimentares da Universidade Federal de São Paulo, “prevenir o TDC não é fácil porque se trata de uma condição com múltiplas causas: hereditárias, psicológicas e sociais”.  “Tudo que afeta a autoestima de alguém, como trauma ou bullying, pode contribuir para o surgimento de percepções distorcidas de sua aparência física”, explica o médico.

Diagnóstico
De acordo com os estudiosos, os primeiros sinais de TDC não costumam ser detectados por psicólogos ou psiquiatras, normalmente, são médicos dermatologistas ou cirurgiões que recebem pacientes que estão buscando procedimentos estético ou cirúrgicos que corrijam as “condições/falhas” que eles imaginam ter.
Alguns indícios podem ser percebidos pelos amigos e familiares que convivem com a pessoa que chega a ter um comportamento obsessivo e compulsivo no dia a dia, como por exemplo o de checar várias vezes, antes de sair de casa, o seu suposto defeito.

O acometido, consumido por uma feiura imaginária, tenta disfarçá-la com roupas largas, óculos escuros ou maquiagem pesada.
Estas pessoas ficam buscando aprovação o tempo inteiro, com perguntas como: “E aí, estou bem?”. Quando o quadro avança, a pessoas que tem a síndrome sente tanta vergonha de seus defeitos que passam a se isolar e não sair de casa. Por fim, o medo de passar vergonha é tão devastador que, muitas vezes, ele desiste de sair e se isola.

A psicóloga Rogéria Taragano, do Programa de Transtornos Alimentares do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas de São Paulo, esclarece que “a preocupação excessiva com a aparência costuma ser indesejada pelo próprio paciente, mas ele tem dificuldade para controlar o que pensa e sente”.
Segundo ela, “essa situação ocupa várias horas do dia e gera intenso sofrimento, além de prejuízo nas relações pessoais e impacto na qualidade de vida”.

Sintomas do TDC
Preocupação patológica: o indivíduo mostra inquietação extrema com uma ou mais “falhas”. Elas podem ser reais (e imperceptíveis aos olhos dos outros) ou imaginárias.
Pensamentos obsessivos: a pessoa costuma pedir a opinião dos outros ou tentar convencê-los de que o tal defeito existe. Quando se compara a terceiros, é normal se subestimar.
Comportamento repetitivo: o feio imaginário se olha no espelho várias vezes ao dia ou, em um único momento, por muitas horas. Na falta do espelho, vale tudo: celular, vitrine e até poça d’água.
Sofrimento exagerado: ter TDC dói. Para disfarçar sua “anomalia”, o portador usa roupas largas, óculos escuros ou maquiagem pesada. Às vezes, evita sair de casa.

Onde está a insatisfação
Mulheres
Pele, cabelos, nariz, seios, quadris, pernas e nádegas.

Homens
Órgãos genitais, cabelo e massa muscular.

Ambos
Peso e abdômen.

No Brasil
De acordo com pesquisas feitas por institutos especializados, aproximadamente 2,5% das brasileiras acham que têm defeitos, a maior incidência da dismorfia corporal está nas mais jovens, com idades entre 18 e 30 anos, mas mantendo altos índices até os 60.
Estatisticamente, 2,2% dos homens brasileiros são acometidos pelo distúrbio, sendo mais comum entre 18 e 21 anos, é verificada uma queda progressiva à medida que envelhecem.
O cirurgião plástico Ivo Pitanguy, foi o primeiro médico a descrever a dismorfia corporal no País, em 1976. Mas somente anos depois, uma dermatologista estudou a fundo a condição.
Luciana Conrado, da Sociedade Brasileira de Dermatologia, defendeu em meados de 2008 sua tese de doutorado a respeito do assunto.
De acordo com sua pesquisa, de cada 100 pacientes atendidos em consultórios de dermatologia, pelo menos 14 seriam portadores de TDC. Nas clínicas de cirurgia plástica, o número é ainda mais alarmante: 57. Luciana alerta: “O dismórfico corporal, por mais tratamentos estéticos que faça, nunca está satisfeito. Quando o médico corrige um suposto defeito, ele logo arranja outro”.

A dermatologista indica que ao menor sinal de TDC, o indicado é buscar um psiquiatra. Na maioria dos casos, o tratamento alia terapia cognitivo-comportamental à prescrição de antidepressivos.
Segundo os estudiosos do assunto, enquanto a psicoterapia cria estratégias de enfrentamento gradual para situações de risco, como se olhar no espelho ou passear, a medicação ajuda a superar entraves como fobia social, ansiedade e síndrome do pânico. A combinação não resolve a distorção da autoimagem, mas atenua significativamente os sintomas.
A psicóloga Joana de Vilhena Novaes, do Núcleo de Doenças da Beleza do Laboratório Interdisciplinar de Pesquisa e Intervenção Social da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, informa que quanto mais cedo o distúrbio for detectado, melhor. “Às vezes, a família só procura atendimento quando o quadro se agrava. Aí, há muito pouco a fazer a não ser internar o paciente”.
“Sem acompanhamento multidisciplinar, os dismórficos corporais podem cometer autoflagelo e até mesmo tentar o suicídio.” Na eterna briga com o espelho, o que faz bem mesmo é zelar pela mente.

Casos famosos
O caso mais emblemático é o do cantor americano Michael Jackson (1958-2009), que se submeteu a inúmeras intervenções plásticas, que alteraram até mesmo o seu tom de pele.
Representando as mulheres, o caso da socialite suíça Jocelyn Wildenstein, de 79 anos chama muita atenção. Jocelyn estima já ter gasto mais de 4 milhões de dólares em tratamentos estéticos e plásticas. Já a ex-modelo inglesa Alicia Douvall, de 40, chegou a perder boa parte do movimento do rosto após se submeter a mais de 350 cirurgias.