Pesquisador alerta para os perigos dos altos níveis de cobre na cultura da videira

2015-04-10_190211

O pesquisador da Embrapa, e doutor em solos, George Wellington da Embrapa Uva e Vinho ressalta os cuidados sobre o uso do cobre na videira. A importância, impacto e recomendações do quê fazer para evitar que o excesso de cobre, que é o principal produto de combate ao míldio, afete os solos e consequentemente o crescimento desse cultivo.
O pesquisador reforça que a uva está presente em diversos estados brasileiros e se constitui numa atividade geradora de emprego e renda para muitas famílias, proporcionando sustentabilidade à pequena propriedade de agricultura familiar e tendo como maior produtor de uvas do Brasil o estado do Rio Grande do Sul. Lembra ainda que a principal região produtora é a Serra Gaúcha onde a viticultura é desenvolvida em pequenas propriedades, que possuem 15 ha de área, em média, sendo destes 40% a 60% de área útil e cerca de 2,5 ha de vinhedos, o pesuuisador aponta a topografia acidentada e pouco mecanizada, predominando o uso da mão de obra familiar. A Serra Gaúcha, como maior produtora de uvas do Brasil, tem clima essencialmente úmido, que favorece a infecção de inúmeras doenças fúngicas.

Um dos principais produtos usados para o controle adimite o pesquisador, é a Calda Bordalesa, que tem como princípio ativo o sulfato de cobre, que é tóxico para os patógenos. “Durante mais de cem anos esse produto foi a principal ferramenta de controle do míldio, a principal doença da videira, o míldio”, reforça. “Mas, apesar de ser eficiente na parte aérea, o cobre tem baixa mobilidade no solo, devido sua interação com as frações de matéria orgânica, e como resultado dos longos períodos de uso, hoje representa um potencial tóxico pelo seu acúmulo nos solos, afetando o crescimento da videira”, alerta George Wellington. A aplicação de fungicidas à base de cobre na vitivinicultura da Serra Gaúcha tem mais de cem anos. Nesta região é comum o emprego da calda Bordalesa para o controle do míldio da videira. “O uso sistemático deste produto em altas concentrações e altos volumes, repetindo por diversas vezes ao ano tem acarretado o acúmulo de cobre nos solos da região. Essas pulverizações são responsáveis pelos teores altos de cobre encontrado nos tecidos da videira e no solo”, ressalta o pesquisador.

Ele explica que o acúmulo desse elemento no solo afeta negativamente a qualidade produtiva e ambiental dos solos. O cobre tende a formar ligações físico-químicas com os grupos funcionais de partículas reativas do solo que, por sua vez, definem os fenômenos de sorção. A disponibilidade desses elementos no solo depende do teor e da composição da matéria orgânica do solo, da fração mineral do solo, que possui alta afinidade pela fração argila, especialmente o grupo dos óxidos, e do valor de pH. No entanto, após anos de aplicações sucessivas de fungicidas à base de cobre há um aumento de todas as frações deste metal no solo, com consequente aumento da disponibilidade do mesmo no solo, especialmente em solos ácidos e arenosos, como aqueles da Campanha Gaúcha da absorção de nutrientes, redução da taxa fotossintética e no crescimento das plantas. “O cobre é um nutriente essencial às plantas, fazendo parte de diversos compostos orgânicos, como proteínas e enzimas vitais ao metabolismo vegetal, atuando no controle da síntese de DNA e RNA, e participando de diversos processos fisiológicos, como fotossíntese, respiração e distribuição de carboidratos” ensina. Porém, quando em excesso pode provocar alterações anatômicas, morfológicase fisiológicas tal como danos às raízes, inibição da absorção de nutrientes, redução da taxa fotossintética e no crescimento das plantas.

Os sais de cobre tornaram-se importantes na supressão de doenças durante o século XIX. A eficácia de uma mistura complexa do cobre para controlar o míldio da videira foi descoberta acidentalmente. Em 1882 na região de Medoc, França, Millardet noticiou que a mistura do sulfato de cobre e cal virgem salpicada sobre as folhas da videira suprimiram o desenvolvimento do míldio. Inicialmente esta mistura foi utilizada para desencorajar o furto de uvas de um vinhedo  Desde então, vem sendo utilizada em diversas culturas para o controle de doenças fúngicas e bacterianas. Quando aplicado à planta, o hidrogel contém, provavelmente, trioxissulfato de cobre com cal adsorvida, cal livre e sulfato de cobre. O míldio causado por Plasmopara vitícola é a doença da videira mais importante no Brasil, bem como em outras regiões vitícolas do mundo. O pesquisador denuncia que o excesso de cobre causa sérios prejuízos à viticultura, em regiões com alta precipitação, principalmente no final da primavera e verão. É também conhecida como peronóspora, mufa ou mofo. Os maiores danos diretos estão relacionados com a destruição parcial ou total dos frutos, podendo também produzir efeitos negativos sobre a produção futura, porque provoca desfolha e consequentemente enfraquece a planta.

Geralmente as variedades de uvas europeias são mais suscetíveis ao míldio que as americanas e hibridas, pois o patógeno é originário da América do Norte e o processo de seleção natural ocorrido naquela região deu origem a genótipos de videira com maior resistência genética à doença. “A fase de maior suscetibilidade da videira ao míldio ocorre desde o inicio da brotação dos ramos até o inicio da compactação do cacho. Todas as partes verdes da videira podem ser infectadas, sendo os primeiros sintomas observados cerca de 5 a 7 dias após a infecção. Os sintomas foliares iniciam-se com manchas circulares amarelas com a aparência de manchas de óleo apresentando um halo castanho- amarelado nas folhas novas que com o tempo acaba desaparecendo. Sob condições climáticas favoráveis, grande número de manchas pode surgir nas folhas que se coalescem com o tempo.”

Noites quentes e úmidas contribuem para o surgimento de esporangióforos com esporângios, que saem dos estômatos na parte abaxial da folha. As lesões tornam-se castanhas e folhas altamente infectadas caem com o tempo. Nos estágios da floração e em bagas pequenas, o patógeno penetra pelos estômatos, causando escurecimento e secamento destes órgãos, nos quais se observa uma eflorescência branca que é a frutificação do patógeno. Normalmente, a frutificação não é muito intensa, pois o engaço e as bagas não possuem muitos estômatos. Após, o estádio de grão ervilha, a infecção ocorre somente no pedicelo das bagas, que toma a coloração amarelo-escuro. As bagas apresentam depressões e consistência endurecida na região próxima ao pedicelo, ficando total ou parcialmente marrom- escuras, destacando-se facilmente do cacho. As bagas infectadas nessa fase apresentam uma coloração pardo-escura, e são facilmente destacadas do cacho, não havendo formação de eflorescência branca característica, sendo denominada peronóspora larvada, porque apresenta sintomas semelhantes aos causados pelas larvas da mosca-das-frutas. A doença causa as maiores perdas na cultura quando a inflorescência é infectada na fase pré-florada, florada e pós- florada.

O ataque intenso do míldio nas folhas ocasiona a desfolha precoce e consequentemente acarretará uvas com menor teor de açúcar, produção de vinhos mais ácidos, menos substancias nitrogenadas e menor vigor na safra seguinte. O cromista Plasmopara viticola é um parasita biotrófico obrigatório, que obtém seus nutrientes das células vivas dos tecidos da planta. Os zoósporos formados no interior dos esporângios são liberados sobre a planta, germinam e penetram somente através dos estômatos.
As hifas crescem nos espaços intercelulares das folhas produzindo haustórios globosos que irão absorver os nutrientes do interior das células. Nas regiões de clima temperado o patógeno sobrevive durante o inverno na forma de o ósporos e micélio. Estas estruturas de sobrevivência tornam-se maduras e germinam em solo encharcado e temperatura acima de 11°C, produzindo macrosporângios, dos quais saem os zoosporângios que vão produzir as infecções primárias. A partir destas infecções, em condições climáticas favoráveis, como alta umidade relativa e temperaturas acima de 11°C, diversos ciclos da doença serão produzidos.

Todos os fatores que contribuem para o aumento da umidade favorecem o desenvolvimento da doença. Portanto, a chuva é o principal fator na promoção das epidemias, enquanto a temperatura exerce um papel moderador, acelerando ou retardando o desenvolvimento do patógeno. No Rio Grande do Sul, nos meses de setembro a março, período do desenvolvimento da videira, a precipitação média fica entre 1.000 a 1.200 mm, enquanto a temperatura oscila entre 16 a 22°C. Nestas condições, o controle da doença é uma tarefa difícil e delicada, e o produtor deve estar em vigilância constante.

Algumas medidas preventivas para o manejo da doença consistem na escolha de áreas bem drenadas, plantio de cultivares resistentes, redução das fontes de inoculo como a poda de brotações contaminadas, adubação equilibrada, evitando o excesso de nitrogênio, fazer desbrota, poda verde para melhorar a penetração da luz solar, visando reduzir a duração do molhamento foliar no interior da copa. Nem todas estas medidas são práticas de serem executadas, nem suficientes para controle eficaz da doença em condições favoráveis, sendo necessária a utilização do controle químico. Uma das razões da necessidade do uso de fungicidas para o controle do míldio é a capacidade do patógenos causar grandes danos em um curto espaço de tempo, tornando os fungicidas a melhor ferramenta de controle da doença. O sucesso do controle químico depende da escolha adequada do produto, bem como a sua dose, do momento e método da aplicação, do conhecimento do organismo e da qualidade da aplicação.