Novos estudos reforçam a urgência de diminuir sal e açúcar na dieta

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E essa orientação não se restringe a pessoas que já têm hipertensão ou diabetes. É questão de vida ou morte para todos. Ler os rótulos ajuda muito

A Organização Mundial da Saúde (OMS) soou o alerta sobre o sal diante do fracasso iminente de que seus 194 países-membros conseguiram diminuir em 30% o sódio adicionado aos alimentos até 2025, compromisso firmado em 2013. Em relatório recém-lançado, aguarda que apenas 5% dos integrantes implementaram políticas de redução obrigatória — o Brasil entre eles, felizmente. Mas a missão, hercúlea por si só, se estende por aqui: ingerimos, ainda, praticamente o dobro de sódio do que é recomendado diariamente. A OMS defende a ideia de que o consumo global médio, hoje na casa de 11 gramas por dia, tenha de cair pela metade ( veja no quadro). Para que as metas sejam cumpridas, é preciso tirar do papel um compromisso coletivo, acompanhando a evolução de grandes empresas, o cumprimento de novas regras de rotulagem e conscientização da sociedade.

A questão é que o atraso ou a negligência na adoção dessas medidas têm repercussões em termos de qualidade e expectativa de vida. “Políticas de redução da ingestão de sódio podem evitar mais de 2 milhões de mortes até 2025 e 7 milhões até 2030”, diz Francesco Branca, diretor do Departamento de Nutrição e Segurança Alimentar da OMS, no relatório. “Não podemos falhar nesse objetivo de saúde pública alcançável e acessível.”

Desafio semelhante se aplica ao açúcar. Uma revisão robusta de estudos, que acaba de ser publicada no jornal científico The British Medical Journal , associação o consumo exagerado a diversos resultados negativos — não apenas ganho de peso e diabetes tipo 2. Cada copo de 250 mililitros a mais de refrigerante ou suco industrializado por dia está relacionado a uma elevação de 17% no risco de doença cardíaca e de 4% no de mortalidade precoce por qualquer causa. A pesquisa acusa uma relação entre o abuso na ingestão de tudo que é doce e a maior propensão a homens tão diversos como câncer de mama, osteoporose e depressão.

Não é tão fácil cortar as pitadas de sal no prato, o açúcar do café e os alimentos ultraprocessados ​​que seduzem o paladar. Mas é essencial rever hábitos e emoções — o que, na prática, significa abrir menos pacotes de comida pronta e priorizar refeições caseiras. E isso antes que uma avalanche de problemas de saúde venha à tona. “O conceito hoje é de prevenção primordial, com alimentação saudável, horas adaptadas de sono e prática de atividade física sempre, não só quando a doença se instala”, afirma Maria Cristina Izar, diretora da Sociedade de Cardiologia do Estado de São Paulo (Socesp ). O que não exclui, claro, a necessidade de intensificar as medidas de controle entre pessoas que tiveram infarto ou derrame ou convivem com enfermidades crônicas.

A diminuição no uso de sal e açúcar passa por um trabalho complexo que não engloba apenas ações educacionais para melhorar escolhas à mesa e controlar a tentativa dos excessos, mas também pelo fomento ao acesso a um padrão alimentar e ingredientes mais saudáveis ​​— desde a infância. Daí o apelo da OMS por políticas nacionais que regulam toda uma cadeia de produção e consumo com impactos que impedem o bem-estar da população. “É preciso debater o papel da alimentação e trazê-la para o centro das nossas vidas de novo, porque as escolhas que fazemos retroalimentam todo o sistema”, diz o cientista Eduardo Nilson, do Núcleo de Pesquisas Epidemiológicas em Nutrição e Saúde da Universidade de São Paulo (Nupens/USP).

Nesse ponto, embora ainda ostente índices elevados no consumo de sal e açúcar per capita, o Brasil já se coloca como exemplo de país no caminho de mitigar danos. Após oito anos de discussão e uma consulta pública com 82.000 contribuições, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) estabeleceu o novo modelo de rotulagem, que prevê o símbolo de uma lupa nas embalagens de produtos com alto teor de sódio, açúcar e gordura saturado. Em vigor desde o ano passado, a mudança permitirá uma avaliação mais fácil e consciente na hora das compras.

Outra frente, encabeçada pelo Ministério da Saúde, foi o acordo com a indústria para a redução massiva no uso de sódio. Em 2018, o governo anunciou um corte de 17.000 toneladas do nutriente em quatro anos. “O Brasil ficou bem situado no relatório da OMS porque já tem a declaração obrigatória para essa redução”, comenta Nilson. “Outros países possuem metas intencionadas, e isso tem menos impacto, pois não previsões esperam às empresas.”

Esse é um tema que não deve ficar só na mão das mulheres e dos governos, é também individual. Uma receita para escapar dos pacotinhos e driblar a paixão por salgados e doces não é segredo. Contempla menos produtos prontos e mais frutas e hortaliças na despensa e, à mesa, pratos mais coloridos e diversos, feitos com especiarias e temperos naturais. Com disposição, treino e paciência, o paladar vai se surpreender com os novos sabores. E o saleiro e o açucareiro poderão ficar para a história.

Afinal, qual é a dieta ideal?

Qualquer planejamento alimentar que se preze estipula moderação no consumo de sal e açúcar. Mas, no afã de melhorar o corpo e a saúde, é comum as pessoas partirem para dietas pré-moldadas, e muitas delas voltam e meia viralizam na internet. Atenta ao fenômeno, a Associação Americana do Coração (AHA, na sigla em inglês) procurou analisar os dez cardápios mais populares nas redes e constatou que as famosas dietas paleolíticas (rica em carnes) e cetogênica (focada em vitamina) são as menos recomendadas do ponto de vista cardiovascular. “A quantidade de desinformação sobre esses padrões de alimentação nas mídias sociais de consumo níveis críticos”, afirmou o médico Christopher Gardner, professor da Universidade de Stanford, nos EUA.

A entidade fez um esquema de acompanhamento dos cardápios com base em orientações de proteção ao coração de acordo com as evidências científicas — o que inclui o equilíbrio na ingestão de nutrientes como carboidratos e vitaminas. No ranking final, a campeã foi a DASH, sigla para dieta de controle da hipertensão. Ela prescreveu maior consumo de frutas, verduras, grãos integrais e carnes magras, modelo semelhante ao da dieta nórdica. Na sequência, vem a prestigiada dieta mediterrânea, também rica em ingredientes naturais, mas com um toque a mais de azeite de oliva, pescados e doses moderadas de vinho tinto. Dietas veganas e vegetarianas ficaram em destaque, mas a AHA sugere, nesses casos, acompanhamento médico a fim de corrigir, se necessário, deficiências de ferro e vitamina B12 devido à falta de produtos de origem animal no cardápio diário.

Os especialistas ainda propõem o resgate de pratos caseiros tradicionais e regionais e de hábitos que foram perdidos na sociedade moderna, como sentar-se à mesa para comer com calma na companhia da família. Isso também se reflete na saúde.