Imagens de santos travestidos de super-heróis ganham a web e despertam polêmica pela irreverência das criações
No próximo dia 31 é comemorado o Corpus Christi, uma das principais festas da Igreja Católica. Com um viés direcionado para a celebração do chamado Corpo de Cristo, religiosos passam o dia celebrando e participando de missas. A Gazeta, com o intuito de observar essa data com outra perspectiva, preparou um especial sobre o “avesso dos santos”, ou seja, mostrando o lado engraçado e curioso de cada santo na perspectiva de diferentes artistas.
Uma série de esculturas criadas pelo artista italiano Igor Scalisi Palminteri, da cidade de Palermo, causou polêmica e controvérsia entre religiosos em 2012. Na série de esculturas, intitulada hagiografias, ele decidiu transformar imagens típicas de santos da Igreja Católica em super-heróis.
A maioria das peças foi pintada com tinta acrílica sobre imagens de gesso e madeira. Palminteri disse, na época, que usou a iconografia religiosa para revelar os seus sentimentos ao ver os santos nas igrejas quando ele ainda era criança. Porém essa visão nada convencional do artista vez com que muitos religiosos classificassem sua obra como blasfêmia.
Segundo o artista, sua experiência em ver fiéis fazendo pedidos a algo superior a eles o levou a ver que cada imagem de santo trazia dentro de si uma “figura heroica”, de acordo com o site io9.com.
Nas peças criadas por Palminteri, Jesus foi retratado em trajes que lembram o Capitão América, e em um quadro com as roupas do Homem Aranha, José foi pintado como Super-homem, Maria como Mulher-Maravilha e a Sagrada Família usa roupas características de Os Incríveis. Outras imagens foram caracterizadas como Batman e Robin, Flash e Mulher-Gato.
A Santa Blasfêmia
Em fevereiro de 2016 a artista brasiliense, Ana Smile foi o centro das polêmicas ao criar esculturas de santos travestidos de super- heróis, assim como o escultor italiano havia feito em 2012. As estátuas tem formatos de heroínas, personagens do cinema, e por isso foram duramente criticadas na web. A “preferida” dos críticos é a versão da Virgem com uma fantasia de heróis que tem chifres.
Na época, Ana concedeu uma entrevista à Vice Brasil, afirmando que era questionada frequentemente sobre não ter medo de ir para o inferno. Mas a artista, que atualmente vive em Goiás, afirmou temer as ameaças mais mundanas. Ana que comercializa suas peças, relatou um caso de agressão verbal na própria loja.
“Um homem desconhecido não gostou, entrou na loja, fez um balão danado, quis chamar todo mundo e exigiu que os vendedores tirassem as peças. Recebi comentários como “Por que você não faz uma santa com a sua cara sendo penetrada”, afirmou ela à Vice.
O impulso para a criação das imagens surgiu quando Ana se deparou com um meme da famigerada dupla Batman e Robin com os dizeres “Santa blasfêmia, Batman”. Ela curtiu tanto a ideia que começou a procurar algo similar para comprar e decorar sua casa. Sem sucesso na busca, resolveu arregaçar as mangas e usar seus conhecimentos em arte. “Sempre gostei de desenhar, fazer bisqui, modelagem, pintura.” Deu certo. Os amigos curtiram a ideia e começaram a fazer encomendas. Ana viu nisso uma boa oportunidade.
Hoje, ela compra peças de gesso cru que, posteriormente, são lixadas, modeladas, pintadas à mão, laqueadas e envernizadas. Os preços variam de R$ 200 a R$ 390 e os itens podem medir de 30 cm até 50 cm de altura.
Ana reforça que as imagens, embora sejam originalmente de santos, não possuem ligação com religião. “Por isso, me frustra tanto esse bafafá todo dos últimos dias. As peças foram criadas como itens decorativos. Não tem nada a ver com religião”, salientou à Vice.
O trabalho de Ana
As peças de Ana são feitas com base em cinco santos: São Benedito, Santo Antônio, São Judas, Nossa Senhora de Guadalupe e Nossa Senhora das Graças. A confecção das estatuetas leva cerca de duas semanas.
A mulher, que também trabalha em um bar, compra os santos em gesso, os lixa e os molda em casa. Depois, seca, laqueia, pinta e inverniza. Ela diz que consegue fazer no máximo cinco estatuetas ao mesmo tempo.
As imagens já foram encomendadas por todos os estados brasileiros e até exportadas para Nova York. A maior dificuldade na venda é justamente a conservação. “Todas têm um filetinho de metal por dentro justamente para tentar diminuir esse risco [de quebra], para ficar um pouquinho mais rígida.”
Barbie Santa
Que a Barbie é uma das bonecas mais famosas do mundo todo mundo sabe. E, vez ou outra, sempre aparece quem queira fazer plásticas para se parecer com ela ou com seu parceiro, Ken. E foi pensando em lançar uma novidade inusitada que, em 2014, artistas plásticos argentinos colocaram a boneca no centro das atenções. Lançaram várias obras em que Barbie e Ken aparecem vestidos de santos.
As peças fazem parte da exposição “Barbie, The Plastic Religion” (Barbie, A Religião de Plástico, na tradução), dos artistas argentinos Pool Paolini e Marianela Perelli, que foram apresentadas em Buenos Aires naquele ano. Dentre outras obras, foram exibidas 33 figuras de Barbie e Ken adaptados como figuras católicas, budistas e do judaísmo e que fazem parte da crença popular argentina.
Na página de Pool no Facebook, uma enxurrada de links com matérias dão um pouco da dimensão que as obras propostas pelos artistas tomou em todo mundo, seja pela curiosidade ou pela indignação. Ainda pelas redes sociais, locais em que os bonecos foram primeiramente apresentados, os artistas consideraram que “se trata de uma visão humorística de feitos históricos e religiosos”.
Polêmica
Uma das obras dos artistas, a Defunta Correa – uma figura venerada popularmente na Argentina –, causou indignação nas autoridades de San Juan, província em que se encontra o santuário de Defunta. Pelo Facebook, Pool tratou de esclarecer essas e outras polêmicas. “Respeitamos a comunidade muçulmana tanto como todas as demais e suas tradições. Nossa obra busca homenagear, e não causar nenhum tipo de ofensa a nenhuma religião”, postou.
A mostra “Queermuseu”
A forma descontraída e inusitada de retratar figuras religiosas ganhou o centro das atenções no ano passado. Com curadoria de Gaudêncio Fidelis, que foi curador da Bienal do Mercosul de 2015, a exposição tinha como mote a diversidade e as questões LGBT. Algumas das obras dialogavam com questões religiosas de uma forma irreverente, e para alguns, agressivas. Após uma enxurrada de críticas na web, a mostra foi cancelada. Uma das obras mais comentadas se refere a figura de Jesus Cristo.
A obra “Cruzando Jesus Cristo com Deusa Shiva”, de 1996, de Fernando Baril, retrata “as inúmeras pernas e braços da figura que reverberam pela superfície da pintura, exibindo objetos de toda ordem nas mãos e pés, muitos deles relacionados à história da arte e à cultura pop”, explica Fidelis no catálogo.