Saúde em dia, bom humor contagiante e muito carinho por todos que a cercam. Esta é Alda Del Magro Bertarello, que no último sábado, 16 de agosto, comemorou 100 anos de vida. São poucas as pessoas que podem contar um século de histórias, com tanta lucidez e alegria como Alda. Em entrevista com seu filho Antônio Luís Bertarello, 66, a família relembrou sua trajetória de vida.
Natural do distrito de São Pedro, com apenas dois anos a menina perdeu o pai, Pietro Merlin, por uma infecção no pé. Com quatro anos, perdeu a mãe para uma pneumonia. Alda lembra até hoje de um fato curioso: ainda criança, diz ter sonhado com a mãe, e mesmo não lembrando de seu rosto, conseguiu reconhecê-la por uma fotografia.
Depois do falecimento dos pais, a pequena Alda, junto com a irmã Elda e irmão Alquides, foi morar com os avós. Infelizmente, uma nova tristeza abateu sobre a pequena Alda: quando completou 7 anos, sua avó veio a falecer, e por conta do trabalho árduo, seu avô vendeu a casa que era dos pais de Alda, repartindo o dinheiro entre as poupanças dos netos, um tesouro que viria a ser muito valioso na fase adulta. As crianças precisaram ser separadas para serem cuidadas por familiares, e Alda ficou sob os cuidados de sua tia, Ofélia Ferri.
A tia era dona da ferraria e também cuidava da roça. Diariamente, ao meio-dia, Alda sempre levava o almoço para os trabalhadores da ferraria e para sua tia durante a lida no campo. Anos depois, já na juventude, não havia garoto que não se interessasse pela moça, mas na época, os costumes não permitiam que as garotas saíssem desacompanhadas. Sabendo disso, toda vez que havia festa na comunidade, Alda convidava dois pretendentes, no caso de um não poder ir. Geralmente dava certo, mas numa das datas, os dois confirmaram presença, e a garota se pegou em um impasse. Decidiu que dançaria com o que entrasse no salão primeiro. O sortudo foi Garibaldi Giacomo Bertarello.
Os dois jovens eram vizinhos, separados apenas por uma ponte, e por isso se conheciam desde sempre. Aos 25 anos, o romance resultou em casamento. O casal ganhou um terreno da tia Ofélia e Adolfho Ferri, e com o dinheiro que o avô de Alda havia guardado na poupança da neta, os recém-casados conseguiram construir a casa onde a família mora até hoje, e com muita graça, conta que o dinheiro ainda sobrou para comprar uma mesa, uma caixa de lenha e uma panela de ferro para fazer polenta. Foi neste período também, que Alda pôde reencontrar a irmã, levada para ser criada por parentes no Paraná, 18 anos depois de serem separadas. Suas histórias cheias de bom humor iniciam aí. Conta que certa manhã, o padre da comunidade passava pela região, e disse para ela que voltaria para o almoçar no mesmo dia. Alda matou um galo, e, por não ter tempo suficiente de limpar o animal inteiro, cozinhou apenas as asas e coxas, e jogou o resto da ave embaixo da pia.
O casal teve quatro filhos, José Pedro, Maria Irene, Antônio Luis e Carlos Icílio, e sempre foi muito querido pela comunidade. Todos os dias amigos e vizinhos iam na sua casa tomar café e conversar. Alda sempre se mostrou uma pessoa extremamente altruísta, jamais negando um prato de comida a quem lhe pedisse.
Em 2002, infelizmente o marido veio a falecer em função de uma leucemia. Alda jamais saiu de seu lado durante o tratamento, ficando com ele todos os dias no hospital, mesmo que já com idade avançada.
Em 2002 começou um de seus maiores desafios. Foi afetada por um problema circulatório, o qual lutou contra por 5 anos, Chegou até a fazer implante de veias, mas infelizmente as operações não deram resultado e precisou amputar uma das pernas. No ano seguinte, teve de amputar a outra. Entretanto, apesar de todas as adversidades, nunca olhou para esses fatos com tristeza. Muito pelo contrário, uma das suas grandes virtudes é sempre olhar o lado bom das experiências que a vida lhe proporciona. Chega até brincar com a situação: “Agora não precisa mais levar água quente para esquentar os pés”.
Hoje, aos 100 anos, tem alguns probleminhas relacionados à idade, mas nada que Alda não saiba como contornar com suavidade e leveza. Enxerga 60% em apenas um olho por conta de catarata e usa aparelho de audição, mas até gosta, pois como fala, enxerga melhor que uma águia e pode escutar apenas quem lhe interessa.
Nenhuma adversidade é grande o bastante para derrubar a nona. Ainda muito vaidosa, está com as unhas sempre pintadas, cabelo arrumado, e é impossível que ela saia de casa sem passar um perfume. Sua autoestima também está sempre nas alturas, sempre diz que está bonita e envelheceu bem. Aliás, adora cores vivas, sua casa lilás é um grande exemplo. É companheira de todos, e adora quando lhe chamam para passeios, onde lhe convidarem para ir, ela acompanhará. Ficou bastante chateada quando soube que não poderia comemorar seus 100 anos com uma grande festa para a família, mas já marcou a festividade para o ano que vem.
O filho Antônio, 66 anos, é quem mora hoje com a mãe, desde que se aposentou, há dois anos. A família ainda tem uma empregada que os ajuda com a limpeza da casa, mas a comida quem faz é o filho, que aprendeu com a mãe a manter uma alimentação saudável. A senhora recusa qualquer tipo de industrializados, o que mantém sua saúde vigorosa. Até do seu bolo de aniversário comeu apenas um pedacinho. Gosta mesmo é das comidas tradicionais. Em seu café da manhã ritualístico às 9 horas, come apenas pão caseiro e café, sempre dando preferência aos sabores da culinária colonial. E não come comida “sobrada”, e se o filho tenta lhe enganar, descobre na hora, não há comida requentada que passe pelo faro de dona Alda.
Para aqueles que desejam saber o segredo de como a noninha chegou aos 100 anos, é simples: levar a vida com leveza, sempre com muita alegria e fé, mas como ela mesma diz “Se a reza é demais, até o santo desconfia”.