As dificuldades e desafios para atendimento ao autista

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“Precisamos de amigos que nos visitem. De voluntários na área da música, das artes e da dança. Eles ficam muito felizes quando recebem visitas”, enfatiza a coordenadora da associação

No dia 02 de março, celebrou-se o Dia Mundial de Conscientização do Autismo. O autismo, ou Transtorno do Espectro do Autismo (TEA) é um transtorno neurológico caracterizado por comprometimento da interação social, comunicação verbal e não-verbal e comportamento restrito e repetitivo, teve seu primeiro diagnóstico registrado em 1938, no Missis-sippi.
Este transtorno atinge dois milhões de brasileiros; em crianças é mais comum que o câncer, AIDS e a diabetes. A ONU estima que existam mais de 70 milhões de pessoas com Autismo. As crianças com 18 meses que ainda não falam e também não apontam para pedir o que querem deve ser investigada.

Atendimento do município
Em Bento Gonçalves, o atendimento das crianças autistas é feito pelo CAPS Infantil (atende crianças e adolescentes até os 17 anos e 11 meses), que conta com uma equipe de um psiquiatra, um assistente social, três psicólogos, uma enfermeira, uma técnica em enfermagem e uma nutricionista.
Conforme Janice Cavalini, a psicóloga e Coordenadora Técnica Caps, “não é possível quantificar o número exato de au-tistas menores de 18 anos que a rede atende, por se tratar de um diagnóstico relativamente novo”. “O Autismo começou a ser tratado de forma mais específica há cinco anos, quando foi reclassificado o Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM).
“Para um diagnóstico correto e definido, quando feito pela rede pública, é preciso que a criança consulte com um pedia-tra. Este profissional fará uma breve avaliação e irá faze os encaminhamentos necessários para neurologistas pediatras e psi-cólogos, que irão solicitar os exames corretos para identificar o transtorno”, explica a coordenadora.
A psicóloga relata ainda sobre as tentativas de trabalhar com os grupos de auxílio às famílias. “Estamos sempre tentando manter conversas com as famílias, promover encontros e bate-papos, pois também nos interessa que a família compreenda que a total inclusão e aceitação delas faz toda a diferença”, detalha.
Segundo ela, o atendimento de crianças autistas em Bento Gonçalves tem condições de atender a demanda, mas o CAPS poderia ter ainda algumas especialidades à sua disposição. “Seria muito importante para o CPAS Infantil que tivéssemos profissionais da área de fonoaudiologia, psicopedagoga e terapeuta ocupacional, pois qualificaria muito mais os atendimen-tos”, justifica.

Associação
A partir dos 18 anos o portador de TEA pode ser acolhido para atendimento na Associação Pró Autistas Conquistar.
Na associação são atendidos 18 jovens e adultos com mais de 18 anos. A pedagoga Cláudia da Cruz Pimentel conta que a entidade atende aos jovens com uma equipe reduzida e, muitos cedidos da prefeitura. “Não temos enfermeira disponível na casa em tempo integral. A prefeitura nos cede uma técnica que vem apenas nas sextas-feiras”.
Para enfatizar as necessidades de mais profissionais, incluindo enfermeira em tempo integral, durante a reportagem da Gazeta, um rapaz que frequenta a Associação, pegou uma lagarta (bicho cabeludo) que estava no jardim da associação, esma-gou e esfregou em sua perna.
Logo, a Coordenadora ligou aos pais do aluno e em seguida para um posto de saúde para pedir auxílio e se informar so-bre providências de atendimento. A mãe do aluno, por estar no trabalho, não pode se deslocar até lá, e no posto de saúde, quem a atendeu, disse que não seria “nada de grave”. Com isso, Cláudia procurou orientação na internet para resolver a ques-tão e aliviar as bolhas que levantaram na pele do jovem.

Acolhimento aos pais
Depois de atendido o jovem, a coordenadora continuou explanando sobre a importância de acolhimento aos pais e famili-ares dos alunos, o que acontece uma vez por mês. “Os pais e familiares também precisam de um olhar especial sobre eles. Sabemos que uma pessoa com autismo ocupa 24h do dia de seus familiares e que, muitas vezes, eles precisam se anular com-pletamente. Promovemos esses encontros para que eles possam trocar experiências e ter um tempo para si”, afirma.
Como a entidade atende pessoas acima de 18 anos, a preocupação com o envelhecimento dos alunos torna-se uma neces-sidade para a sociedade. “Tivemos o caso de um aluno que, já adulto, perdeu os pais, e o irmão não tinha condições psicológi-cas de cuidar do aluno e acabou internando o rapaz em uma clínica de repouso para idosos. O rapaz começou a regredir e chegava aqui usando fraldas. Solicitamos que o responsável retirasse de lá. Uma cuidadora foi contratada para ficar com ele, que acabou assumindo ele para sempre como seu. Acho que está na hora dos nossos governos começarem a pensar na criação de um lar para estes casos”, aponta.
Hoje, a instituição se mantém com doações e parte dos gastos são pagos pela prefeitura, como alimentação, material de higiene e outros. “Precisamos de amigos que nos visitem, de voluntários na área da música, das artes e da dança. Eles ficam muito felizes quando recebem visitas”, enfatiza Cláudia.
A Associação Pró Autistas Conquistar realizará no próximo domingo (07), na Praça Aquiles Micarone (Igreja São Ben-to), uma tarde de integração, para comemorar a passagem do dia 02 de abril.

De mãe para mãe
Para Sinara Asunção da Cunha, mãe de João Vitor, 07 anos, o diagnóstico chegou quando o menino atingiu os 04 anos de idade. “No primeiro contato com a escola, a professora solicitou que consultássemos um psicopedagogo, e este, por sua vez, encaminhou o João para um neuropediatra. Fizemos muitos exames que definiram TEA (Transtorno do Espectro Autista) ”, conta.
Sinara conta que não teve tempo para sofrer com a notícia, pois atender às necessidades do filho virou seu projeto de vi-da. “Precisamos nos moldar aos horários dele. Hoje ele faz terapia de música, frequenta fonoaudióloga duas vezes na semana e consulta com o neurologista. Acabamos não tendo mais vida social, mas todo o amor e carinho que ele nos dá, vale qualquer sacrifício”, afirma.
João está no primeiro ano da escola regular e reconhece e escreve algumas palavras. “Sabemos que o desenvolvimento dele poderá ser mais lento, mas isto faz parte do autismo. Os colegas o adoram. Recebem ele com muito amor na escola e ele retribui. Isso para mim, como mãe é gratificante demais”, conta.
Para a mãe, autismo não é uma doença. “As mães e as famílias precisam “abrir a cabeça. Quando a criança tem alguma crise, as mães e familiares precisam estar preparados. Precisam encontrar força. Encha seu filho de amor e não tenha pre-conceito. Ele é igual aos outros! Ele só é autista”, conclui.
O Autismo não tem cura, mas o diagnóstico precoce potencializa o sucesso do tratamento através da intervenção com as terapias especificas.

 

Sianara Assunção da Cunha: “seu filho é igual aos outros. Só é autista.”
Claudia da Cruz Pimentel, coordenadora, neuropsicopedagoga e especialista em educação inclusiva da Associação Pró-Autistas Conquistar