Adoçante zero é ligado a maior risco de infarto, aponta estudo

2015-04-10_190211

Procurado por ser pouco metabolizado pelo corpo, o eritritol pode aumentar a formação de coágulos, levando também à ocorrência de AVC, mostra estudo americano com 1,1 mil pessoas

Anunciado como natural, zero caloria e com dulçor semelhante ao do açúcar, o eritritol foi promovido, nos últimos anos, a adoçante da moda. A substância, porém, pode não ser tão inócua assim. Um estudo da Clínica New Cleveland, nos Estados Unidos, publicado na revista Nature Medicine, indica que o produto está associado a um risco aumentado de distúrbios cardiovasculares, especialmente infarto e acidente vascular cerebral (AVC). Os cientistas, porém, ressaltam que entre os 4 mil participantes, havia uma alta prevalência de fatores de risco e que mais pesquisas precisam confirmar se as descobertas também se aplicam a pessoas aparentemente saudáveis.
O eritritol está presente em pequenas quantidades em frutas e legumes. “Mas quando incorporado a alimentos processados, normalmente seus níveis são 1 mil vezes superiores às quantidades naturalmente encontradas no organismo”, explica Stanley Hazen, presidente do Departamento de Ciências Cardiovasculares e Metabólicas da Clínica New Cleveland e autor correspondente do artigo. Isso é necessário porque a substância é menos doce que a sacarose. Em alguns artigos de confeitarias, o teor do adoçante chega a representar 60% do peso do alimento, explica Hazen.
Segundo o pesquisador, depois da ingestão, a substância é pouco metabolizada, e a maior parte dela é excretada na urina. “Consequentemente, o eritritol é caracterizado como um adoçante ‘zero em calorias’ e ‘natural’, levando a uma popularidade crescente, com previsão de a participação no mercado de adoçantes duplicar nos próximos cinco anos”, diz Hazen.
Porém, pouco se sabe sobre os níveis circulantes de eritritol e os riscos cardiometabólicos. Enquanto os primeiros estudos a respeito encontraram benefícios potenciais, como ação antioxidante em modelos animais e melhora na função vascular em pessoas com diabetes, outros detectaram aumento de peso em estudantes com níveis mais altos do adoçante na corrente sanguínea. Também já se sugeriu que o eritritol tem associação com aparecimento de distúrbios metabólicos.
Três anos
O novo estudo foi realizado em duas etapas. Na primeira, os autores selecionaram 1.157 participantes que passaram por testes para identificar moléculas na corrente sanguínea e, assim, detectar a presença e os níveis do eritritol. Essas pessoas foram acompanhadas por três anos, e monitoradas quanto a desfechos cardiovasculares, incluindo morte. Em seguida, os dados foram confrontados aos de pesquisas semelhantes realizadas nos Estados Unidos e na Europa com, respectivamente, 2.149 e 833 indivíduos.
Nos três grupos, os resultados indicaram que pessoas com níveis mais elevados de eritritol no sangue tinham probabilidade maior de sofrer um evento cardíaco adverso grave em três anos, como infarto, AVC ou morte. Todos os participantes tinham fatores de risco no início, como colesterol alto, hipertensão e índice de massa corporal (IMC) na faixa da obesidade.
Em seguida, os cientistas fizeram estudos em laboratório com amostras de oito indivíduos saudáveis que tomaram um líquido contendo concentrações da substância semelhantes à média observada na corrente sanguínea das pesquisas prévias. O efeito do eritritol foi avaliado tanto no sangue total quanto apenas nas plaquetas (células que se agrupam para evitar sangramento e, em excesso, contribuem para a formação de coágulos).
Os resultados revelaram que o eritritol ativou mais facilmente as plaquetas, aumentando o risco da formação de coágulos. Segundo Stanley Hazen, estudos com animais confirmaram que a ingestão da substância pode ter esse efeito adverso. “As doenças cardiovasculares aumentam com o tempo, e as doenças cardíacas são a principal causa de morte em todo o mundo. Precisamos garantir que os alimentos que ingerimos não sejam contribuintes ocultos”, afirma. “É importante que mais estudos de segurança sejam conduzidos para examinar os efeitos a longo prazo dos adoçantes artificiais em geral, e do eritritol especificamente, sobre os riscos de ataque cardíaco e derrame particularmente em pessoas com maior risco de doença cardiovascular”, conclui.
Cautela
Professor de nutrição e ciência alimentar na Universidade de Reading, no Reino Unido, Gunther Kuhnle é cauteloso ao avaliar o estudo. Ele destaca, por exemplo, que, no teste com os indivíduos saudáveis que tomaram um líquido contendo eritritol, a quantidade da substância na amostra foi 10 vezes maior que a permitida em bebidas pelos órgãos regulatórios. “A dose única usada foi mais do que a maioria de nós ingeriria durante um dia inteiro”, diz. “Esse é um dos motivos pelos quais os reguladores estabelecem limites para o uso de aditivos alimentares em adoçantes: para proteger o público e garantir ingestão está em uma faixa segura.”
Kuhnle esclarece que o eritritol não é usado apenas em alimentos, mas em produtos como pasta de dente e alguns medicamentos, o que poderia afetar o resultado do estudo, já que não é possível identificar a origem da substância detectada no sangue. “Especialmente os medicamentos podem afetar os resultados observados, pois concentrações plasmáticas mais altas podem indicar que os participantes recebem tratamentos médicos diferentes. Concordo que a informação é interessante e útil, mas definitivamente não deve causar preocupação a ninguém.”