Vilão invisível ataca a memória de pessoas que comem muita gordura

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Cientistas de UFRJ e Unicamp mostram que o palmitato, presente em alimentos industrializados, laticínios e carnes vermelhas, pode causar inflamação cerebral Cientistas brasileiros descobriram que uma substância gordurosa extremamente consumida prejudica o cérebro. A substância é o palmitato. Difícil encontrar quem nunca o tenha ingerido, mas pouca gente já ouviu falar dele. Extraído principalmente do óleo de palma, ele está na maioria dos alimentos industrializados, laticínios e carnes vermelhas. Além do alerta sobre o risco dessa gordura para o cérebro, o estudo abre caminho para o desenvolvimento de novas formas de tratar a perda de memória. De biscoitos a massas, passando por bolinhos, enlatados, margarina, manteiga, maionese, molhos, chocolates, queijos gordurosos e embutidos, o palmitato é muito comum. É uma gordura saturada sem cor, ingerida sem ser percebida pelo consumidor. Está até mesmo no leite desnatado, empregado para melhorar a consistência. Consumido em excesso, porém, ele funciona como um gatilho para reações inflamatórias no cérebro, cujo resultado são falhas de memória e, possivelmente, o aumento do risco de demência.  A pesquisa foi publicada na revista científicas “Cell Reports”, uma das mais influentes do mundo.  — Consumir um pouco de palmitato não faz mal. O problema é o consumo exagerado, em dietas com alto teor de gordura e pobres em outros nutrientes, como vemos em pessoas que sofrem de obesidade ou estão com sobrepeso — afirma a coordenadora do estudo, Fernanda de Felice, do Instituto de Bioquímica Médica Leopoldo de Meis, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). O trabalho foi todo realizado no Brasil, por cientistas da UFRJ e da Universidade de Campinas (Unicamp).

Prejudicial à circulação
Já se sabia que o palmitato pode prejudicar a circulação sanguínea e está associado à resistência à insulina. Mas esta é a primeira vez que se mostra que ele também afeta o cérebro.
Dados observados em seres humanos foram comprovados em experiências com animais, que revelaram ainda o mecanismo pelo qual o palmitato provoca uma espécie de curto circuito e ataca a memória. — O cérebro também sofre com o que acontece com a periferia do corpo — observa a pesquisadora. Primeiro, os pesquisadores descobriram que pessoas obesas ou com sobrepeso e que sofrem de problemas cognitivos, como perda de memória e dificuldade para aprender, têm níveis de palmitato elevados. Eles estudaram os casos de 49 pessoas com obesidade atendidas no Hospital das Clínicas da Unicamp, que aceitaram participar da pesquisa. Por meio de análise do líquor cerebrospinal, os pesquisadores viram que os obesos sem distúrbios cognitivos não tinham níveis elevados de palmitato. Eles foram então entender como o palmitato prejudica o cérebro. Fizeram isso com estudo de camundongos que receberam doses elevadas dessa gordura. O palmitato ativa exageradamente células do cérebro chamadas microglias e deflagra reações inflamatórias em cadeia. O principal alvo são os neurônios do hipocampo, estrutura cerebral essencial para a memória. O estudo levanta a possibilidade de tratar perdas de memória associadas à elevada concentração de palmitato por meio do controle da inflamação.

Controle a ingestão de gordura
Os cientistas vão estudar agora se há relação entre a ingestão elevada de palmitato e o mal de Alzheimer. Mas o objetivo imediato é alertar para a necessidade de controlar a ingestão de gordura.
— O excesso de peso está associado a diabetes, hipertensão e dislipidemia. Pessoas com obesidade não raro sofrem algum tipo de atrofia cerebral e têm problemas de memória. Mesmo quem não é obeso, mas está com sobrepeso, deve se preocupar em controlar a ingestão de gordura, pois nessa fase é possível evitar o agravamento de problemas — destaca a pesquisadora. Ela lembra que 1,9 bilhão de pessoas no mundo estão acima do peso ou sofrem de obesidade. — Ninguém é obeso porque quer. Trata-se de uma doença agravada pela dificuldade de acesso a uma alimentação mais saudável. Alimentos industrializados de baixa qualidade nutricional são baratos e práticos, mas os danos à saúde são consideráveis e as pessoas deveriam ingeri-los com moderação — frisa De Felice.