Vírus e a sociedade: pesquisa mostra como as pessoas reagem à pandemia

2015-04-10_190211

Um ano depois do surgimento do Sars-CoV-2, pesquisa norueguesa aponta 16 tipos de comportamentos que emergiram nao longo da crise pandêmica.

Algumas personalidades negaram a gravidade. Outras foram à janela, aplaudir os profissionais de saúde. Muitos se ofereceram para fazer compras para os mais velhos. E teve quem se aproveitasse da situação, vendendo produtos, como kits de vitaminas, que supostamente protegeriam contra o inimigo comum da sociedade atualmente. Um ano depois do início da pandemia, uma pesquisa da Universidade de Bergen, na Noruega, identificou e listou 16 personalidades associadas diretamente à crise da covid-19.

A pesquisa afirma que a identificação das personalidades emergentes é necessária para nortear políticas públicas capazes de intervir sobre os efeitos de comportamentos prejudiciais, como o dos negacionistas. Ou dos que passaram a culpar os chineses pela pandemia. De acordo com a pesquisa, sob a justificativa da covid-19, traços latentes, como xenofobia, racismo e intolerância, foram colocados para fora.

Se percebe que em sociedades pluralistas, as respostas comportamentais individuais variam de acordo com os valores pessoais, contextos situacionais e identidades dos grupos, podendo afetar o cumprimento das políticas e a transmissão viral.

Uma das personalidades listadas é a dos “invencíveis”, que, por se acharem imunes a qualquer problema, desobedecem as normas de distanciamento e fazem festas, se aglomeram em bares, praias…
Ainda sobre os negacionistas, especialmente aqueles com poder de influenciar milhares de pessoas, acabam incentivando que seus apoiadores ignorem as medidas capazes de ajudar a frear a disseminação viral.

Em abril de 2020, líderes mundiais clamaram para a população a adotar medidas de distanciamento, de uso de máscaras e de isolamento. Em contraste, líderes populistas resistiram a essas medidas, como o presidente Jair Bolsonaro, que nega a covid-19 como uma ‘histeria’ da mídia e exorta os brasileiros a voltarem ao trabalho e às escolas contra as restrições impostas pelo Estado.

Fusão
As identidades virais, não surgem do nada, mas apenas foram reforçadas pela pandemia. Os comportamentos emergentes dos indivíduos se fundiram aos de grupos sociais e políticos.
Com os Estados Unidos, onde governadores democratas insistiram nas medidas de isolamento, enquanto, no geral, os republicanos fizeram o oposto.Os comportamentos de distanciamento social refletem identidades virais politizadas e polarizadas, como aqui no Brasil assistimos.

Por outro lado tem comportamentos positivos que se destacaram durante a pandemia, como o dos altruístas, que se prontificaram a ajudar os mais fragilizados, se oferecendo para fazer compras para pessoas do grupo de risco na fase mais estrita de distanciamento social. Outra personalidade destacada no estudo é a dos realistas, que mudaram de hábitos para se adaptar à nova realidade.

As personalidades que mais se evidenciam são as que estão em sintonia com o espírito da época. As que mais se evidenciam são as que se encaixam nas projeções de desejos e vergonhas que todos nós carregamos e, em situações extremas, se corporificam em atitudes. O destaque de alguns tipos de personalidades são respostas aos anseios de um momento.

Geralmente, traços dessas personalidades podem ser identificados nas pessoas antes de situações como a pandemia atual. Elas já dão pistas de como podem se comportar nesse tipo de situação extrema. Os traços de personalidade estão diluídos nas mais diversas áreas e estão em construção e desenvolvimento desde a infância.

Mas precisamos ter atenção para o perigo do determinismo de reduzir a experiência da vida, que é ampla e complexa, a uma rigidez de ser apenas um tipo de personalidade. A experiência da vida é sempre desafiadora e o ser humano é capaz de aprender novos conceitos e ampliar sua atuação. Ter um traço de personalidade não é uma sentença, a capacidade humana de ampliar e evoluir com as experiências é inesgotável. Assim, evitamos extremismos de estereótipos, preconceitos e discriminações.

É muito importante que as políticas de saúde pública saibam identificar e atualizar seus conhecimentos sobre os tipos de personalidades. O entendimento do público-alvo é importante para desenvolver estratégias eficientes e, principalmente, no processo de comunicação de tais estratégias.

Um medo altruísta pesquisado

Um estudo da Universidade da Pensilvânia e do Hospital Pediátrico da Filadélfia identificou um padrão altruísta no temor que as pessoas têm da covid-19. Segundo a pesquisa, realizada com 3.042 participantes dos Estados Unidos e de Israel, com idades entre 18 e 79 anos, descobriu que o que mais preocupava a maioria não era adoecer, mas que alguém da família fosse infectado, e também a possibilidade de transmitir o vírus sem saber.
Em abril, logo depois que as medidas de isolamento foram adotadas na maior parte do mundo, os pesquisadores lançaram uma pesquisa on-line para estudar o estresse e a resiliência durante a pandemia.
A pesquisa mediu seis fontes potenciais de estresse: contrair o vírus; morrer da covid-19; estar no momento contaminado; ter um membro da família infectado; infectar outras pessoas sem saber; e enfrentar dificuldades financeiras significativas.

Entre os que participaram, o medo de os familiares contraírem o vírus (48,5%) e de eles próprios infectarem outras pessoas sem saber (36%) superou o sofrimento associado à própria contaminação pelo Sars-CoV-2 (19,9%). Os entrevistados com pontuações de resiliência mais altas apresentaram preocupações mais baixas relacionadas à covid-19, assim como uma taxa reduzida de ansiedade (65%) e depressão (69%).
“Com base em nosso estudo, parece que as pessoas estão mais preocupadas com os outros do que com elas mesmas ao relatar suas preocupações, mas a resiliência ajuda a reduzir o estresse, bem como a ansiedade e a depressão”, diz Raquel Gur, MD, PhD, professora de Psiquiatria da Universidade da Pensilvânia.