Mulher conquista o direito de receber óvulos doados pela irmã

2015-04-10_190211
A doação de óvulos já é praticada entre anônimos, a decisão garantirá a doação entre duas irmãs

Duas irmãs de Bento Gonçalves tentaram realizar um procedimento de fertilização, uma doando os óvulos a outra, mas foram impedidas em razão de uma normativa do Conselho Federal de Medicina, que prevê que doação de gametas e embriões deve ser anônima. Para conseguir esta autorização ingressaram com ação em novembro de 2018 contra o Conselho Regional de Medicina do RS- Cremers.
As irmãs alegaram que uma delas já tentou realizar todos os procedimentos existentes em relação à fertilização, mas nenhum deles trouxe resultado. A irmã que será a receptora da doação foi diagnosticada com infertilidade sem causa apontada, o diagnóstico lhe fez buscar a opção alvo da discussão do processo.
O Cremers alegou como tese defensiva, que no Brasil não há legislação reguladora acerca da reprodução assistida e para preencher essa brecha na legislação, o Conselho Federal de Medicina instituiu norma tendo como norte os princípios éticos e bioéticos. Sendo determinado o anonimato dos receptores e doadores de gametas ou embriões.
De acordo com o Cremeres, a normativa busca a segurança dos pacientes acerca de possíveis questionamentos biológicos de parentalidade. Sustentam ainda que se o procedimento deixar de ser anônimo poderá acarretar em transtornos psicológicos emocionais e até jurídicos entre os envolvidos.

Decisão da 1° Vara Federal de Bento Gonçalves
A demanda foi analisada pelo Juiz Federal Substituto Eduardo Kahler Ribeiro, pontou que baseando-se na argumentação apresentada por parte contrária, a normativa que prevê o anonimato, busca evitar conflitos futuros que venham a discutir a filiação biológica ou afetiva gerada pelo procedimento. Não havendo nenhum impeditivo ligado a saúde para nenhum dos envolvidos.
O Juiz pontua em sentença, que a norma abarca questões de relações sociais e culturais que se referem ao conceito de família utilizando laços biológicos, o que possibilita o questionamento dos parâmetros quanto a sua atualidade, já que o anonimato vem sendo flexibilizado em diversos países, para que garanta o bem estar físico das crianças frutos dos procedimentos, para que possam conhecer a sua origem genética.
O magistrado ainda destaca que o casal deve ter autonomia para escolha das técnicas de reprodução assistida que irão utilizar que faz parte do planejamento familiar, pontuou ainda que a autora já foi submetida a diversos tratamentos para tentar engravidar, mas que não conseguiu, pois foi diagnosticada com infertilidade, pontua ainda que não há banco centralizado de óvulos na cidade, o que dificulta encontrar outras doadoras para preservar o anonimato.
Em entrevista exclusiva à Gazeta, o Juiz Eduardo Ribeiro esclareceu quando questionado se a normativa do CFM era inconstitucional: “Na sentença foi feito um juízo da inconstitucionalidade da norma a partir do caso concreto, tendo por base as provas dos autos. Considerou-se que o direito ao planejamento familiar do casal, previsto no art. 226 da CF, estava sendo limitado de forma desproporcional, porque a razão de ser da regra do anonimato (impedir a futura discussão acerca da filiação) podia ser afastada diante das especificidades do caso. Não houve um juízo de inconstitucionalidade de toda a resolução do CFM e tampouco dessa regra em relação a todos os demais casos”.
O Juiz informou que: “a revogação da norma do CFM depende ou da iniciativa do próprio Conselho, editando outra resolução, ou da iniciativa do Poder Legislativo, regulamentando por lei a feritilização in vitro heteróloga. A sentença não impede a eficácia da resolução do CFM para disciplinar a reprodução assistida, apenas afastando a regra do anonimato no caso concreto.”.
A sentença do juiz declarou procedente a ação concedendo ás autoras o direito a realização da fertilização in vitro heteróloga, sem a aplicação da cláusula proibitória prevista na resolução do CFM. Ao Cremers é imposta a obrigação de não realizar nenhuma providência que impeça o procedimento. Foi concedida a tutela de urgência que tornam os efeitos da decisão imediatos.
Para que a decisão transforme-se em precedente, é necessária: “a confirmação da sentença pelo TRF da 4ª Região, em Porto Alegre, e, a partir daí, da possibilidade das razões de decidir consideradas serem replicadas em outros casos.”.
De acordo com o Juiz, “Na situação, considerou-se um julgado do TRF da 3ª Região, em São Paulo, no qual se decidiu no mesmo sentido”.