Igualdade, reconhecimento visibilidade e patrocínio, é o que elas precisam!

2015-04-10_190211

Nunca se ouviu falar tanto em futebol feminino como nesta última Copa Mundo na França, que de acordo com a Federação Internacional de Futebol – FIFA, está sendo um recorde de audiência com mais de 1 bilhão de espectadores no mundo inteiro, a Federação afirma que traçou objetivos para aumentar o apelo do esporte feminino ao redor do mundo.
Os reflexos puderam ser percebidos também no Brasil, foram batidos recordes de audiência das transmissões de partidas da Copa feminina transmitida pela primeira vez na televisão aberta.
Além da televisão aberta, as redes sociais estão fervilhando de notícias e memes sobre o futebol feminino, é claramente o ano em que a visibilidade do esporte está maior.
Embora tenha sido eliminado pela seleção da França, o time brasileiro teve destaques através das jogadoras Formiga, que bateu recorde de participações em Copas do Mundo, esta foi a 7° competição disputa por ela; Cristiane que foi uma das artilheiras da Copa, com quatro gols feitos e Marta, que bateu dois recordes superando os números do futebol feminino e masculino, sendo eleita pela 6° vez a melhor jogadora do mundo e também a artilheira das copas, marcando o seu 17° gol na penúltima partida jogada pelo Brasil na competição.
Além do show com a bola no pé, Marta recebe destaque por suas declarações e posicionamentos contundentes sobre a necessidade de valorização e investimento no futebol feminino.
O cenário atual, mesmo com as dificuldades enfrentadas, já é mais positivo que o de outros anos, demonstra um cenário mais positivo em relação a outros anos, trás importantes questionamentos. Quais mudanças motivaram este efeito? O que ainda pode ser feito para que o futebol e outros esportes praticados por mulheres sejam mais valorizados? Quais as diferenças e dificuldade enfrentadas pelas mulheres neste meio e por que ainda há tanta diferença, principalmente na valorização financeira das jogadoras?

Histórico e conquista de espaço

Pé de mulher não foi feito para se meter em shooteiras, diz manchete de jornal de 1941, ano em que decreto proibindo futebol feminino foi assinado no Brasil

É até difícil de acreditar, mas há 40 anos ainda vigorava no Brasil um decreto que proibia as mulheres de jogar futebol e outros esportes, a normativa (decreto lei 3.199) assinada por Getúlio Vargas em 1941 previa em seu artigo 54: “às mulheres não se permitirá a prática de desportos incompatíveis com as condições de sua natureza, devendo, para este efeito, o Conselho Nacional de Desportos baixar as necessárias instruções às entidades desportivas do país”.
O decreto-lei foi válido por 38 anos, de 1941 até 1979 quando foi revogado, mas a modalidade só foi regulamentada no Brasil em 1983, entretanto havendo determinações como: a proibição de cobrança de ingresso para os jogos; as jogadoras não podiam trocar camisas com as adversárias após o jogo, as partidas duravam 70 minutos e tinham intervalo de 15 a 20 minutos.
A primeira seleção feminina de futebol só foi criada pela Confederação Brasileira de Futebol – CBF em 1988, cerca de 74 anos após a criação da primeira seleção masculina de futebol. Já a primeira Copa do Mundo Feminina foi realizada na China em 1991, mais de seis décadas após a Copa do Mundo Masculina que aconteceu em 1930 no Uruguai.
As competições masculinas e femininas nunca tiveram a mesma visibilidade, sendo o torneio feminino ignorado pelo público e pelas emissoras de televisão do Brasil por muitos anos. A maior projeção da seleção e da competição está sendo em 2019, que quatro canais nacionais possuem o direito de transmissão ao vivo.
Mesmo com as melhorias e progressos notados ao longo dos anos, as diferenças entre as competições e seleções dos homens e mulheres são nítidas e certamente são reflexos dos mais de 30 anos de proibição. As jogadoras enfrentam dificuldades das mais variadas, entre elas, as piores condições de trabalho; salários inferiores; preconceito; falta de oportunidades; pouco incentivo e falta de patrocínio.

Chuteiras da Marta

A jogadora Marta joga com uma chuteira sem patrocínio, mas com um símbolo que representa um pedido de igualdade de gênero

E foi sobre estas questões, falta de patrocínio, preconceito, desigualdade, que Marta chamou atenção do mundo inteiro ao marcar o gol de pênalti contra a Austrália na segunda partida da Seleção na Copa Feminina.
Marta apontou para as suas chuteiras personalizadas, no momento da comemoração, mostrando ao mundo um símbolo que representa um pedido de igualdade de gênero no esporte. A jogadora nunca foi de dar muitas declarações, neste sentido a jogadora disse após o gesto de mostrar s chuteiras no jogo contra as australianas: “Não gosto de falar, gosto de mostrar”.
Entretanto, após o episódio, no jogo que o Brasil foi eliminado pela França, Marta fez um pronunciamento que viralizou nas redes sociais, servindo como um alerta e um pedido para que as novas atletas dediquem-se e conquistem ainda mais espaço, seguindo um legado que ela e Formiga ajudaram a construir.
Entre as palavras emocionadas e carregadas de força, ditas por Marta na ocasião, as principais foram: “Não vai ter uma Marta para sempre, uma Cristiane, uma Formiga. E o futebol feminino depende de vocês para sobreviver”. “Chore no começo para sorrir no fim”, concluiu.
Embaixadora de causas de empoderamento feminino e do futebol jogado pelas mulheres, Marta vem dando cada vez mais voz a tudo aquilo que pensa, após a conquista do 17° gol, tornando-se a maior artilheira do Mundial de todos os tempos, a atleta disse: “Hoje temos uma mulher como a maior goleadora das Copas. Esse recorde não representa só a jogadora Marta, mas todas as mulheres num esporte ainda visto por muitos como masculino” e completou “Eu divido com vocês que lutam e batalham em todos os setores e ainda têm de provar que são capazes de desempenhar qualquer tipo de atividade. É nosso!”.
Marta atua no Orlando Pride, dos Estados Unidos, equipe que entrou com uma ação contra a federação local USA Soccer, alegando discriminação de gênero, pois, mesmo elas gerando receita maior que os homens, acabam recebendo cinco vezes menos que a seleção masculina. As jogadoras do time norte americano, solicitam muito além de um aumento de seus salários, elas buscam reconhecimento, visibilidade, equiparação e igualdade.
A luta das americanas é mais um dos inúmeros movimentos que vem acontecendo ao redor do mundo, buscando os mais amplos direitos de igualdade e são graças a esses movimentos que as mudanças vêm acontecendo.
A jogadora Marta está sem contrato de patrocínio com empresas de artigos esportivos desde julho de 2018, quando a empresa Puma propôs a renovação do contrato por um valor bem inferior ao que recebia, representando nas palavras de Marta, um abismo entre o que os homens recebem, ela optou por não aceitar a renovação e segue sem patrocínio, usando sua chuteira com o símbolo do movimento que luta pela igualdade de gênero “Go equal” .
De acordo com os estudiosos do tema, a discrepância entre salários de jogadoras e jogadores é explicada pala discriminação de gênero que é arraigada em toda a cadeia esportiva, este abismo ficou ainda mais nítido a partir de uma pesquisa divulgada pela revista “France Footbal” que demonstrou os maiores salários do futebol mundial.
Na lista Ada Hegerberg, da Noruega, eleita a melhor do mundo em 2018, recebe € 400 mil por temporada o que representa um ganho 325 vezes menor do que Messi, se o valor fosse dividido por mês, Ada receberia o salário de € 33 mil (aproximadamente R$ 150 mil) e para o argentino os ganhos mensais representam € 10,8 milhões por mês ( aproximadamente R$ 47 milhões).

Delegação brasileira que disputou a Copa do Mundo Feminina 2019 na França