Conflito Irã-EUA: por que combustível vai subir no Brasil, mesmo sendo autossuficiente?

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Brasil é autossuficiente em petróleo, mas não escapa da alta internacional

País produz mais do que consome desde 2006, mas preços seguem mercado global por limitações no refino

O Brasil enfrenta um paradoxo energético que poucos compreendem: apesar de ser autossuficiente em petróleo há quase duas décadas, o país não consegue se blindar totalmente contra crises internacionais como a atual ameaça iraniana de fechar o Estreito de Ormuz.

A explicação está numa equação aparentemente contraditória: produzimos mais petróleo do que gastamos, mas ainda dependemos do mercado externo para produtos refinados como gasolina e diesel.

O que significa ser autossuficiente

Desde 2006, o Brasil extrai entre 3,7 e 4 milhões de barris de petróleo por dia, enquanto consome cerca de 3 milhões. O excedente é exportado, principalmente o petróleo pesado do pré-sal, reconhecido mundialmente pela alta qualidade.

“Temos petróleo de sobra, mas falta capacidade de transformá-lo nos produtos que realmente usamos no dia a dia”, explica um executivo do setor, que preferiu não se identificar.

A questão do refino

O gargalo está nas refinarias. O país possui 13 unidades que conseguem processar apenas 75% a 80% do que consumimos em derivados. O restante – principalmente diesel e gasolina – precisa ser importado já refinado de outros países.

É como ter uma fazenda produtiva, mas não ter moinhos suficientes para transformar todo o trigo em farinha.

Números da dependência:

  • 20% a 25% do diesel consumido vem de fora
  • 15% a 20% da gasolina é importada
  • Querosene de aviação: dependência parcial

Por que os preços sobem mesmo assim

A Petrobras segue a Política de Preços de Paridade Internacional (PPI), ou seja, cobra pelos combustíveis o mesmo valor do mercado global, independentemente de onde vem o petróleo.

A lógica é simples: se a empresa vendesse mais barato internamente, perderia dinheiro, pois poderia exportar o mesmo produto por preços maiores no exterior.

“É como um produtor de café que vende para o vizinho pelo mesmo preço que consegue no mercado internacional”, compara o economista especialista em energia Pedro Cordeiro.

Impactos da crise do Oriente Médio

Com a tensão envolvendo Irã e Estados Unidos, o petróleo tipo Brent – referência mundial – já subiu mais de 15% em duas semanas. Isso se reflete automaticamente nas bombas brasileiras.

Efeitos diretos: Mínimos, já que não importamos do Golfo Pérsico

Efeitos indiretos: Significativos

  • Aumento automático dos preços internos
  • Pressão sobre derivados importados
  • Impacto na inflação e custos de transporte

Cenários possíveis

Fechamento temporário (1-2 semanas)

  • Combustíveis 10% a 15% mais caros
  • Impacto controlado com uso de estoques

Fechamento prolongado (1-3 meses)

  • Alta de 25% a 40% nos preços
  • Possível racionamento de alguns produtos
  • Pressão severa sobre a economia

Guerra regional

  • Preços internacionais disparam
  • Brasil pode lucrar como exportador
  • Mas população sofre com custos elevados

Por que não investir mais em refinarias

Construir ou expandir refinarias demora de 5 a 10 anos e custa bilhões. A última grande expansão foi concluída há mais de uma década. Além disso, há questões tecnológicas: o petróleo brasileiro é pesado e exige equipamentos específicos para refino.

Estratégias de proteção

O país mantém reservas estratégicas para 15 a 20 dias de consumo e tem acordos regionais com Argentina e Uruguai para troca de produtos. Também acelera investimentos em biocombustíveis, como o etanol, que pode substituir parte da gasolina.

A conta final

“O Brasil está numa situação confortável de suprimento, mas vulnerável aos preços”, resume a analista energética Marina Santos, da consultoria Gas Energy. “Somos reféns não da falta de petróleo, mas das limitações para transformá-lo no que precisamos.”

Isso significa que, enquanto não aumentarmos significativamente nossa capacidade de refino, continuaremos sentindo no bolso as turbulências geopolíticas de regiões distantes, mesmo sendo autossuficientes na matéria-prima.

O paradoxo brasileiro resume-se assim: temos o ingrediente, mas dependemos dos outros para fazer o bolo.

 

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