Pesquisa revela que brasileiros consideram aborto uma questão de saúde pública

2015-04-10_190211
Uma pesquisa inédita revela que, para 43% dos brasileiros, o aborto já é considerado um tema de saúde pública, não de polícia (13%)

O estudo “Opiniões sobre o aborto no Brasil”, ouviu 1,6 mil pessoas, de 12 regiões metropolitanas do país

Estima-se que, anualmente, ao menos 800 mil mulheres abortem no país. Os números tratam de interrupções voluntárias de gestação em clínicas clandestinas ou por ingestão de medicamentos, feitos de maneira ilegal, fora das condições plenas de atenção à saúde e sujeitas à prisão. Por décadas, mulheres protagonizaram históricas manifestações em busca da descriminalização completa do aborto — ou por um pouco de empatia. Algo, entretanto, parece mudar, por mais contradições que o tema ainda apresente.
Uma pesquisa inédita revela que, para 43% dos brasileiros, o aborto já é considerado um tema de saúde pública, não de polícia (13%). Porém, para metade da população, uma mulher que interrompeu a gestação deve ser punida e levada à prisão. Mas, apesar disso, apenas 7% das pessoas alegaram que denunciariam à polícia uma irmã, uma prima ou uma amiga que tivesse cometido um aborto voluntário.O estudo “Opiniões sobre o aborto no Brasil”, conduzido pelo Instituto Locomotiva, em parceria com o Instituto Patrícia Galvão, uma agência de conteúdos multimídia sobre os direitos das mulheres brasileiras, ouviu 1,6 mil pessoas, de 12 regiões metropolitanas do país, de diferentes classes sociais e níveis de escolaridade. Os dados do levantamento estampam o que já estava aparente: o aborto ainda é um tema delicado, conflituoso e de difícil entendimento para os brasileiros.
Maíra Saruê Machado, diretora de pesquisas do Instituto Locomotiva e responsável por conduzir o levantamento, explica que as opiniões contraditórias são decorrentes da bagagem estigmatizada que a palavra “aborto” ainda carrega. De acordo com a especialista, quando se humaniza o procedimento, ou seja, tenta aproximar o tema ao entrevistado, ele tende a olhar para a causa com um viés diferente. “As pessoas repensam a opinião delas sobre o abortamento quando são colocadas situações específicas e, principalmente, com pessoas próximas a elas. Por isso vivem essas dicotomias”, justifica.
Maíra conta que o principal motivo para a realização da pesquisa foi saber o que o brasileiro pensa sobre o tema, sem abordagens gerais. Como uma novidade, foram incluídas perguntas de saúde pública e de responsabilidade social. Por não haver muitos dados sobre o tema, a diretora de pesquisa comenta que não há parâmetros que possam ajudar na avaliação de mudanças concretas de pensamento nas respostas: “Os números foram dentro do esperado, porque há uma rejeição natural quando se fala em aborto. Mas, quando se pensa em mulheres em situações de vulnerabilidade, a aceitação tende a subir. E isso pode ser visto como positivo”.

Vulnerabilidade
Os resultados obtidos através da pesquisa mostram ainda que, apesar das contradições, a maioria da população segue em sintonia com o que ainda está na legislação brasileira. Quando questionados sobre o aborto em sua forma legal, os participantes apoiaram a legalização do procedimento. Cerca de 67% deles são a favor da interrupção em caso de estupro; 61%, quando a mulher corre risco de morte; e 50% quando o feto for diagnosticado com alguma doença grave e incurável.
Em casos cujos temas fogem aos já decididos por lei, os entrevistados se mostraram contrários ao aborto voluntário. Apenas 37% são a favor do ato quando a mulher tem até 14 anos; 25% são a favor quando não há condições familiares e financeiras para continuar com a gestação e só 16% são a favor do aborto quando a gestação não é planejada. Apesar do estigma, quase metade dos brasileiros conhece ao menos uma mulher que tenha cometido um aborto voluntário.