Pesquisa estabelece importante relação entre alimentação e sintomas de depressão

2015-04-10_190211
Dieta equilibrada pode ser uma nova arma no combate à depressão

Uma nova linha de estudo dentro da psiquiatria criou escalas de nutrientes essenciais que podem ajudar a combater transtorno que já é considerado o mal do século

Você se preocupa verdadeiramente com o que coloca no prato? Parece que os cientistas estão cada vez mais convencidos de que as consequências de nossas escolhas alimentares podem afetar, e muito, nossa saúde mental. Uma linha de pesquisa que surgiu em 2009 vem estabelecendo um vínculo íntimo entre a composição do prato e o surgimento dos sintomas da depressão.
E foi durante o último Congresso da Associação Americana de Psiquiatria, que o Dr. Drew Ramsey, psiquiatra e professor da Universidade Colúmbia (Estados Unidos) apresentou uma escala de nutrientes considerados essenciais não só para prevenir o distúrbio, mas também para tratá-lo. A notícia representa um avanço importante no combate à essa doença que já é considerada o mal do século (mais de 100 milhões de pessoas desenvolvem sintomas de depressão a cada ano).
Segundo o pesquisador, ômega-3, magnésio, fibras, zinco e ferro são os grandes benfeitores, além das vitaminas C, B1, B9 e B12. Ramsey defende uma dieta rica em folhas verdes, oleaginosas e peixes e afirma que depois de alguns estudos, foi observada uma diminuição considerável nos riscos de depressão: cerca de 50%.
Quanto mais os cientistas avançam nessa abordagem, mais provas conclusivas surgem indicando a estreita relação entre saúde da mente e alimentação. “ Quando o fornecimento de nutrientes é reduzido, o sistema nervoso até adota meios alternativos para manter as obrigações em dia, mas ele não consegue realizar todas as atividades normalmente”, explica a nutricionista e neurocientista Selma Dovichi, da Universidade Federal do Triângulo Mineiro (UFTM). Para a professora, esse quadro leva a uma menor oferta de neurotransmissores e falhas na comunicação entre os neurônios – alterações que aumentam a possibilidade de surgirem transtornos como a depressão.
E ao que parece, a dieta mediterrânea – rica em nozes, pescados, cereais, vegetais em geral, grãos integrais e azeite de oliva – é mais uma vez a que se destaca. Após uma longa investigação com aproximadamente 7400 participantes, o estudo espanhol Predimed apontou esse padrão alimentar como o mais indicado. Apesar do foco principal da pesquisa ter se voltado para doenças cardíacas, os autores também coletaram dados relacionados à depressão – analisados posteriormente pelos estudiosos da Sociedade Internacional para Pesquisa em Nutrição Psiquiátrica (ISNPR – sigla em inglês). A conclusão apontou a ligação nítida entre o menu mediterrâneo e a prevenção de distúrbios mentais como a depressão.

Evitando o estado de inflamação
Para a presidente da ISNPR e diretora do Centro de Alimentação e Humor da Universidade Deakin (Austrália), Felice Jacka, uma dieta que prioriza a qualidade dos alimentos é constantemente associada a um menor risco de depressão. O tema é relevante e gera cada vez mais interesse por parte dos pesquisadores, tanto que a ISNPR já agendou para julho desse ano, em Washington (EUA), o primeiro congresso internacional que busca aprofundar as discussões a respeito do papel da alimentação nos transtornos psiquiátricos.
E um ponto chama a atenção quando se fala em alimentação equilibrada: ela seria um meio de evitar que o organismo fique sob estado de inflamação. Cenário que, segundo o médico Sérgio Tamai, da Associação Brasileira de Psiquiatria, leva à inibição do chamado fator neurotrófico, responsável por estimular a formação de novos neurônios. “Vários experimentos indicam que irregularidades no processo de neurogênese levariam aos abalos depressivos”, explica.
O fato é que certos nutrientes apresentam uma importante afinidade com o cérebro e sua ingestão afeta diretamente o desempenho do órgão, centro do sistema nervoso. Mas é bom lembrar que não adianta ingerir esses nutrientes se outros, pró-inflamatórios, não forem diminuídos. “O alto consumo de açúcar, sal, alimentos refinados e gordura saturada, contribuem para o surgimento de sintomas depressivos”, sinaliza Ana Lúcia Rodrigues, farmacêutica que lidera uma equipe no Laboratório de Neurobiologia da Depressão da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). E ressalta. “Encher a fruteira sempre é bacana. Mas também é preciso maneirar em algumas coisas”.

Ultrapassando gerações
E em relação às dietas com características inflamatórias, foi observado que os malefícios que ela acarreta podem atravessar gerações. Durante um estudo, o nutricionista Cristiano Mendes da Silva, do Laboratório de Neurociência e Nutrição da Universidade Federal de São Paulo (Campus Baixada Santista), ao oferecer uma dieta rica em gordura saturada às cobaias grávidas ou em processo de amamentação, percebeu que o cérebro dos filhos saiu prejudicado. Além de apresentarem atraso no desenvolvimento de certas habilidades, demonstraram um comportamento mais propenso à depressão.
Mas o detalhe importante é que, ao contrário das mães, eles não ingeriram altas doses de gordura, e esse fato leva os pesquisadores a constatarem o triste legado da má alimentação. Além desse estudo, as pesquisas da ISNPR – durante o acompanhamento de mais de 20 mil mulheres e seus filhos – também identificaram essa conexão: as crianças daquelas que mantinham uma dieta desequilibrada durante a gestação apresentavam comportamentos mais relacionados a distúrbios mentais.

Terapia aliada à dieta equilibrada
Em relação ao tratamento da depressão, existe uma grande expectativa de que a adoção de uma dieta equilibrada continue apresentando efeitos significativos. Durante um estudo realizado nos Estados Unidos, cientistas acompanharam pacientes mais idosos que apresentavam sintomas de quadro depressivo para testar uma nova forma de psicoterapia. Mas os pesquisadores resolveram comparar essa terapia com um aconselhamento direcionado para a dieta alimentar e o resultado surpreendeu a equipe: as mudanças nos hábitos alimentares conseguiram frear o avanço da doença tanto quanto a psicoterapia.
Em outra pesquisa liderada pela especialista Felice, os resultados também mostraram que uma dieta mediterrânea é altamente eficiente para melhorar casos de depressão já estabelecidos. E para milhões de pessoas que enfrentam os sintomas da doença, essa é, sem dúvida, uma ótima notícia. É claro que isso não significa o abandono dos remédios, mas talvez, a combinação de ambos – medicação e nutrientes especiais – otimize os resultados de forma surpreendente. E lance uma nova luz na busca pela cura dessa doença sombria e limitante.