Mesa da paz: uma técnica Montessori para resolver conflitos em casa

2015-04-10_190211
É importante que a criança não se sinta forçada a sentar-se à mesa da paz porque ela vai ver isso como uma punição e, em vez de relaxar, provavelmente ficará mais zangada e frustrada

Uma das maiores dificuldades do ser humana é saber reconhecer e identificar os próprios sentimentos. As relações interpessoais e até consigo mesmo é prejudicada pela falta de autoconhecimento, porque isso não permite respeitar aquilo que é natural em qualquer ser humano: as emoções, sejam elas boas ou ruins. O ideal é que esse processo de conhecimento de si mesmo seja iniciado o mais cedo possível, o que significa que é tarefa dos pais incentivá-lo.
Para isso, o já conhecido método Montessori, que prioriza a autonomia e o desenvolvimento natural das crianças, propõe uma prática pedagógica que foi elaborada para auxiliar as crianças na resolução de seus conflitos e na expressão de seus sentimentos nas mais diversas situações: a “mesa da paz”.
Segundo Haline Galbier, que é consultora em Educação Infantil e especialista em Pedagogia Montessori, a mesa da paz não deve ser confundida com o “cantinho do pensamento”, utilizado por muitos pais como uma espécie de castigo para os filhos. “O intuito da mesa da paz não é o castigo e sim incentivar a liberdade de comunicação entre pais e filhos”, afirma a especialista.
A “mesa da paz” é um ambiente criado dentro de casa, onde os pais podem conduzir as crianças quando elas estiverem se sentindo nervosas, tristes ou com qualquer outro sentimento ruim que precisa ser expressado para que os pais possam ajudar a criança a lidar com isso da melhor forma. Segundo Haline, a prática estimula o desenvolvimento cognitivo e emocional, ensina valores como honestidade e justiça, além de aproximar a família e tornar a criança mais segura e confiante.
A especialista em Educação Especial e Inclusiva e professora do curso de Pedagogia da Universidade Positivo, Nelly Narcizo de Souza, lembra que Maria Montessori, a criadora do método, sempre se preocupou com essa perspectiva de pacificação na educação desde a infância. “Ela foi uma grande defensora da educação como ferramenta para a consolidação da paz na humanidade”, explica Nelly. E é por isso que o recurso da “mesa da paz” tem como objetivo propiciar um ambiente em que a criança possa se expressar e aprender a lidar com seus conflitos.

Demonstrar os sentimentos não é sinal de fraqueza
Por muito tempo, a cultura em que vivemos nos ensinou que o sentir não é algo bom e que demonstrar os sentimentos é sinônimo de fraqueza. Segundo a psicóloga Ana Caroline Bonato, essa percepção traz consequências ruins tanto para cada pessoa quanto para a sociedade de maneira geral. As emoções boas e ruins fazem parte das nossas vivências e experiências e elas têm funções importantes na vida de cada um. “A raiva nos alerta para coisas que entram em conflito com os nossos ideais e expectativas. A tristeza sinaliza aquilo que é importante para nós, aquilo que a gente valoriza. Então todas essas emoções têm funções bastante importantes em nossas relações e em nosso entendimento enquanto seres humanos”, afirma.
Diante disso, Ana Caroline destaca a importância de orientar e motivar as crianças a identificarem todos esses sentimentos no próprio corpo, a poder expressar, a conseguir nomear, porque isso vai ajudar no autoconhecimento e no entendimento das situações. Segundo a psicóloga, criar esse hábito dentro de casa com os pequenos pode trazer resultados significativos na vida adulta. “Se mais pessoas aprendessem desde criança a entender quando estão com raiva de alguma coisa, por exemplo, como o corpo fica, e aprendessem estratégias para poder lidar com isso de uma forma mais assertiva e saudável, nós teríamos um número menor de adultos tendo atitudes impulsivas como temos visto nos noticiários”, diz Ana.
O ambiente também pode ser uma ótima oportunidade de motivar a resolução de brigas e a reconciliação entre irmãos. Por meio de uma simples mediação com perguntas para cada um, a resolução de um conflito pode acontecer de uma forma mais natural e pacífica, sem precisar “obrigar” a criança a perdoar ou a pedir perdão para o irmão – atitude que muitos pais tomam e que mais prejudica do que resolve a situação. A psicóloga Ana lembra que, mais do que qualquer método, o que mais ensina as crianças é o exemplo dos pais. Portanto, se, dentro de casa, os pais não têm uma atitude pacífica na hora de resolver seus próprios problemas e discussões um com o outro, não há “mesa da paz” que funcione.

Como montar uma “mesa da paz”?
Segundo a especialista Haline, a escolha do local é o primeiro passo. “Deve ser tranquilo, neutro, sem muito estímulo e informação”, explica.

Sugestões de local
Mesa que ajude na postura da criança e proporcione o “olho no olho”; Tapete confortável; Banquinho.
“O espaço não precisa ser grande, mas deve ser organizado, com cores claras, confortável e deve convidar à tranquilidade, ao diálogo e à reorganização emocional. Por isso, não se recomenda que o espaço tenha excesso de objetos”, lembra Nelly.

Sugestões de objetos

Uma sugestão de objeto para a mesa da paz é a ampulheta de pelo menos um minuto de duração, que faz com que as crianças relaxem enquanto observam os grãos de areia caírem

Plantas; Retrato da família; Espelho; Rostos com expressões (você pode pedir para a criança identificar como está se sentindo através deles); Sino (que pode ser tocado quando a criança estiver se sentindo melhor ou quando a situação for solucionada); Ampulheta de pelo menos um minuto de duração, para que as crianças relaxem enquanto observam os grãos de areia caírem. Além disso, eles podem usá-la como um indicador para dar a volta da palavra para o outro.
Vale a pena esclarecer que a mesa da paz não é apenas uma técnica válida para resolver conflitos interpessoais, mas também conflitos internos. Se a criança se sentir nervosa, zangada ou frustrada, pode usar a mesa da paz como refúgio para identificar como se sente e se acalmar.

Como é usada a mesa da paz?
Em primeiro lugar, é importante que a criança não se sinta forçada a sentar-se à mesa da paz porque ela vai ver isso como uma punição e, em vez de relaxar, provavelmente ficará mais zangada e frustrada. Você pode dizer: “Esta é a mesa da paz, você pode usá-la quando se sentir triste, oprimido ou irritado. Você vem até a mesa, senta e observa os grãos de areia caírem.”
A ideia é que as crianças se sentem à mesa e expressem como se sentem, respeitando as conversas. Você pode usar a ampulheta para marcar a vez de quem fala. Quando o turno acabar, você deve passa a palavra para outra criança. O mais importante é que as crianças expressem positivamente suas emoções, expliquem porque se sentem assim e, acima de tudo, como gostariam de resolver o problema. Eles também podem comentar sobre as possíveis soluções e como elas se sentiriam colocando-as em prática.
Se as crianças forem muito pequenas, um adulto terá que agir como mediador. De fato, é conveniente que no início você medie a conversa para que as crianças não caiam em atitudes acusatórias, mas em vez disso aprendam a se concentrar em encontrar soluções. Tenha em mente que os adultos não devem agir como juízes, mas como meros mediadores, para que as próprias crianças possam encontrar a solução. No entanto, você pode propor uma série de regras, tais como: não gritar, não bater, não insultar, não interromper e não tirar sarro do outro.

 

Fonte: Sempre Família