Mais do que o vinho, o visitante vem em busca do turismo de experiência, aponta pesquisa

2015-04-10_190211

Turismo de experiência, é o que buscam os visitantes da região da uva e vinho, aponta a última pesquisa , feita através da metodologia de big data, que o setor vitivinícola desenvolveu para traçar o perfil do enoturista
A pesquisa foi apresentada ao Jornal Gazeta pelo gerente de promoção de mercado interno e externo do Instituto Brasileiro do Vinho – IBRAVIN a mais de dez anos, Diego Bertolini, que atua no setor vitivinícola há mais de 15 anos, com passagens pela Cooperativa Vinícola Aurora e Angheben Vinho Finos, além de coordenador da última Fenavinho.
Como estudioso, em constante preparação para o mercado, Diego participou de cursos como WSET – Wine & Spirit Education Trust, níveis I, II e III, e sommelier para a Federação Italiana de Sommelier – FISAR.
Diego visitou de forma técnica todas as regiões vinícolas no Brasil e países como África do Sul, Argentina, Austrália, Canadá, Chile, Estados Unidos,Espanha, Franca, Itália e Uruguai e finalizou em 2018, Wine & Spirits Global MBA por Kedge Bussines School.
As seções internacionais do MBA que ele concluiu, foram focadas no mercado mundial de vinhos e destilados, “uma grande oportunidade de troca de experiências com profissionais de países como a Austrália, China, Estados Unidos e França”, segundo Bertolini.

Perfil do consumidor
Em entrevista exclusiva à Gazeta, Bertolini reforçou que o “enoturismo é uma das principais ferramentas de promoção do vinho brasileiro, por isso, a pesquisa apresentada é uma instrumento que auxilia muito o setor. Esta pesquisa que permite um mapeamento do consumidor, e assim traçar estratégias de promoção do turismo, baseado no que de fato o traz até aqui, beneficiando não só o setor produtivo mas os de serviços, como hotéis e restaurantes”.
A pesquisa revelou que a primeira motivação do turista quando vem a região Uva e Vinho, diferente do que se pensa, não é o vinho, e sim a experiência que o produto gera ao redor da garrafa, além da paisagem e todos os atrativos naturais, além de questões territoriais e históricas da imigração italiana.
Como aumentar o turismo
Bertolini aponta alguns pontos que devem ser trabalhados para conquistar ainda mais turistas.
Como um dos dois principais pontos de aprimoramento, está o aumento de atrações ao público infantil, que é uma deficiência hoje, quando pensamos em receber o turista na serra gaúcha. É muito importante que o setor identifique de que forma irá possibilitar mais atrações e experiências ao público infantil, esclarece Diego Bertolini: “ Quando uma família pensa em fazer uma viagem, os principais pontos levados em conta são a estrutura e atrações para as crianças, em relação a isso temos vários grandes cases no mundo, como a Disney e o Beto Carrero”.
Outro ponto identificado na pesquisa, é a necessidade de exploração do setor de compras efetivamente . “Podemos citar a região das hortênsias, principalmente Gramado e Canela que trabalham com atrações como Museu Da Moda e shoppings que proporcionam aos turistas uma série de ofertas atrativas. Na nossa região até existem algumas ofertas neste sentido, mas são muito tímidas se compararmos as que são ofertadas ao público enófilo”.

Novos empreendimentos
Os dados apresentados na pesquisa permitem que seja feito um planejamento setorial estimulando investimentos neste sentido, como é o caso de dois grandes empreendimentos que serão lançados nos próximos anos às margens da BR 470, como o parque temático Dissegna Land, que terá investimentos de mais de R$ 200 milhões e que pretende atrair no primeiro ano mais de 300 mil pessoas.
Outro empreendimento de grande vulto previsto para os próximos anos na BR 470 é o Boulevard Convention que será um centro turístico integrado com lojas, restaurantes e centro de convenções.

Concentração do setor
Como 15 vinícolas do país são responsáveis por 65% da comercialização industrial e das 1.100 vinícolas do país 660 estão no Rio Grande do Sul, Bertolini vê um grande futuro para o crescimento da exploração do enoturismo, já que destas 660 as vinícolas, 90% são de pequeno porte e com muita potencialidade de desenvolver cada vez mais o de experiência, que é de grande procura.

Perfil do mercado brasileiro
A pesquisa mostra que dos 220 milhões de habitantes do País, aproximadamente 120 estão na faixa entre 18 e 60 anos, que podem consumir bebidas alcóolicas, e destes, 32 milhões consomem vinhos regularmente. “Logo, existem cerca de 90 milhões de consumidores que não interagem com a categoria de vinho e que podem ser conquistados,” pontua Bertolini apontando para um espaço imenso de crescimento do setor.
“O brasileiro tem um consumo de vinho de 1.93 litros anuais por pessoa o que é muito tímido, se comparado a outros países, com uma média de 22 litros como o Uruguai e 26 a Argentina.” avalia.

Mercado para vinícolas de pequeno porte
Em um dos MBA, Bertolini estudou a região de Napa Valley, localizada a 100 quilômetros de San Francisco na Califórnia, que é uma das mais grandiosas regiões de enoturismo do mundo, recebendo por ano milhões de turistas e foi objeto de estudo de um dos módulos do Wine & Spirits Global MBA.
Lá foi identificado que a venda direta ao consumidor é o ponto mais forte da região , segundo Diego Bertolini, que estudou Napa Valley. “A realidade do mercado americano é muito próxima a do mercado brasileiro, nos EUA , cinco vinícolas representam 75% das vendas e aqui 15 representam 65%”. Em Napa Valley, as vinícolas de pequeno porte usaram o enoturismo como estratégia comercial para aumentar as vendas aos consumidores finais, neste sentido
Diego questiona : “quando o enoturista vem para cá, e tem essa experiência, nós vendemos o vinho para ele, porém como fidelizar este turista para ele ser um cliente perene para o resto do ano? Isto é o que podemos aprender com Napa.”
Na região estadunidense, foi utilizada como estratégia para fidelizar o cliente, a criação de clubes de vinho, que fornecem vinhos aos consumidores durante todo o ano, depois da visita à vinícola. Isto fez com que as vinícolas daquela região desenvolvessem e explorassem da melhor maneira o mercado de vendas diretas ao consumidor.
“Aqui no Brasil, começa agora uma movimentação de mercado neste sentido. As pequenas e médias vinícolas passaram a focar mais nas vendas diretas ao consumidor final, usando o enoturismo como uma ferramenta para “capturar” e fidelizar esses clientes”, revela.
De acordo com Diego, esta é uma nova estratégia, já que a prática comercial do setor sempre foi à venda aos distribuidores, varejistas e restaurantes. Porém, em razão da complexa questão tributária do Brasil, que dificulta as relações comerciais para as empresas menores, a adoção desta estratégia é crescente, já que com as vendas diretas ao consumidor há uma redução de questões tributárias que envolvem a comercialização.

Grandes indústrias
O atual perfil comercial do setor, utilizando como base uma pesquisa da Associação Brasileira de Supermercados – Abras, demonstra que 81% das vendas de vinho no Brasil, são feitas através de supermercados.
Para ganhar competitividade, o grande desafio do setor é a redução da carga tributária, já que, conforme esclarece Diego Bertolini: “O maior cliente da indústria vinícola é o supermercado, mas também é o maior concorrente, já que com a importação direta ele não paga substituição tributária, o que faz com que a margem na venda de vinhos seja muito alta para o supermercadista.”
Paro especialista no tema, “O setor como um todo, precisa desenvolver uma estratégia para redução da carga tributária, começamos agora no Rio Grande do Sul, com o fim da substituição tributária, anunciada na Fenavinho. Em outubro, Santa Catarina retira a substituição tributária e em novembro será a vez do Paraná, se retiramos em São Paulo, Rio de Janeiro e Minas, cerca de 80% da venda de vinhos será contemplada, este já é o primeiro passo.”

Acordo Mercosul e UE
Com o acordo bilateral do Mercosul e União Europeia – UE, haverá uma redução na taxa de importação de vinhos, neste sentido é necessário que sejam desenvolvidas medidas compensatórias juntamente com o governo. Para Diego a redução da carga tributária para as grandes empresas é um fator de sobrevivência, sendo este um primeiro ponto que merece atenção no setor.
O segundo ponto a se desenvolver em relação ao mercado, é o foco para conquista de mercado e valorização do consumidor, já que, como explica Diego Bertolini: “o suco de uva, em 2008 representava 18 milhões de litros comercializados no país, hoje, são mais de 120 milhões. Um exemplo é a Cooperativa Aurora que tem 50% do seu faturamento baseado na venda do suco de uva. Isso faz com que produtos como suco de uva, espumante e alguns varietais, em relação a vinhos finos, sejam muito valorizado, é importante perceber e focar nesta movimentação”.
Para Diego, é muito difícil a competição com países como o Chile e Argentina que têm imposto zero de importações e comercializam ao consumidor final, vinhos abaixo de R$ 30,00. “Daqui a 12 a 15 anos, com a entrada dos produtos europeus, nós precisaremos estar muito cientes de quais as nossas forças, em relação a produtos e como iremos competir no mercado”, completa.

Futuro
A indústria precisa redirecionar o foco para produtos que são a “vaca leiteira” da região que são os espumantes, sucos de uva e vinhos finos, reforça Bertolini. “ É preciso analisar as potencialidades em relação a cada produto para ganhar e conquistar cada vez mais consumidores em um vasto cenário a ser explorado”, conclui .