Crianças também podem ter artrite

2015-04-10_190211
Obese fat boy suffering from knee pain and sit on bed, Healthy problem

Imagine o seguinte quadro: uma pessoa acorda e sente os músculos rígidos; espreguiça para relaxar e sente dor e inchaço nas articulações; ao levantar, derruba o celular, e ao abaixar para pegá-lo, sente dor nas costas. Quantos anos você daria para esse paciente? Parece improvável, mas ele pode ter 8 anos e, naquela ocasião, estava em um dia normal acordando para ir para a escola. Ao contrário do que muitas pessoas pensam, a artrite não é uma doença que atinge apenas os idosos. Ela pode acometer pacientes muito mais jovens e causar grande impacto na qualidade de vida deles e da família.
Os sintomas listados acima são apenas alguns possíveis sinais da artrite idiopática juvenil (AIJ), um conjunto de doenças que acomete crianças de 6 meses até os 16 anos. A AIJ tem caráter autoimune (o próprio organismo dispara reações que provocam a doença), causa desconhecida (idiopática) e é caracterizada por inflamação que dura no mínimo 6 semanas em pelo menos uma articulação. Além da dor e do inchaço, pode haver aumento de temperatura na região atingida e outros sintomas que vão variar conforme o tipo específico de artrite:
AIJ poliarticular: atinge 5 ou mais articulações;
AIJ oligoarticular: atinge 4 ou menos articulações;
AIJ sistêmica: atinge todo o organismo, não apenas as articulações;
Artrite psoriásica juvenil: artrite associada a psoríase;
Artrite relacionada com entesite: atinge a região em que tendões se unem aos ossos e pode comprometer a coluna.
Em certos casos, não são somente as articulações que sofrem. Em todos os tipos, mas principalmente na AIJ oligoarticular, pode ocorrer também uma complicação chamada uveíte, inflamação do olho que pode levar à cegueira se não for tratada adequadamente. Os principais sintomas são vermelhidão no olho, dificuldade para enxergar e incômodo com a luz. Porém, em alguns casos a inflamação pode ser assintomática; ou seja, quando se sabe que a criança tem artrite, é importante levá-la ao oftalmologista regularmente mesmo que ela não apresente sintomas. Existem outras complicações relacionadas à artrite na infância, como problemas nos pulmões ou nódulos na pele, mas são mais raras.
No tipo sistêmico, além das dores articulares a criança tem febre alta, geralmente duas vezes ao dia, durante semanas ou meses, que pode vir acompanhada de erupção cutânea (pontinhos vermelhos que surgem no tronco, nos braços e nas coxas). Outros sinais são fadiga, mal-estar, gânglios aumentados (especialmente na região do pescoço) e aumento do fígado e do baço. Daí o nome “sistêmico”, que significa que o organismo é afetado de forma generalizada.

Desconhecimento
Existem várias doenças que podem causar artrite. Doenças oncológicas, como a leucemia, por exemplo. Então, quando o médico atende uma criança com artrite, ele precisa descartar outras causas. Se não encontrar nada e a artrite persistir, ele vai chegar a esse diagnóstico.
O desconhecimento sobre a doença e a ideia de que artrite é uma doença da velhice é outro empecilho para o diagnóstico, pois muitos pais associam as queixas dos filhos a problemas mais comuns, como dores de crescimento, que não causam nenhum comprometimento articular grave. Ou pensam que a criança está sentindo dor porque caiu durante alguma brincadeira ou jogo e acabou se machucando – mesmo que ela não atribua a dor a nenhum acidente. A prevalência da AIJ é de 1 para cada 1000 crianças, o que a torna a causa de artrite crônica mais comum na infância. O atraso no diagnóstico tem impacto direto na qualidade de vida da criança e de sua família.
Mesmo que sintomas diversos possam ocorrer, a dor nas articulações pode ser suficiente para ser incapacitante. As limitações variam conforme as articulações acometidas:
Artrite no quadril, joelho ou tornozelo: limitação na marcha, dificuldade para andar, correr, subir escadas e fazer atividades comuns do dia a dia;
Artrite na sacroilíaca (articulação na região da bacia): limitação na flexão do tronco, dificuldade para abaixar e pegar objetos;
Artrite no punho, dedos da mão, cotovelo ou ombro:limitação do membro superior, dificuldade para abrir caixas, maçaneta do carro e portas em geral, colocar algo em cima de uma prateleira e pentear o cabelo, por exemplo.
Os médicos conseguem medir o grau de comprometimento e dar uma nota para a limitação articular. Se a dor é capaz de impedir atividades como girar uma maçaneta, é possível imaginar o impacto que tem no cotidiano de uma criança. Elas têm dificuldade para praticar esportes ou qualquer outra atividade física, muitas vezes não conseguem participar de certas brincadeiras ou mesmo ir à escola. Tais desdobramentos acabam gerando consequências sociais e emocionais. Estudos que comparam crianças que não têm doença nenhuma com crianças que têm AIJ mostram que a qualidade de vida realmente é diminuída nesses pacientes. Felizmente, hoje o tratamento é muito eficaz e grande parte das crianças volta a ter uma vida normal, como a dos seus amigos.

Tratamento
O tratamento da AIJ vai depender do tipo, da gravidade e do número de articulações acometidas. Hoje existem diretrizes muito bem estabelecidas para tratar a doença. O tipo oligoarticular, por exemplo, pode ser tratado com corticoides, enquanto o sistêmico pode exigir o uso de medicamentos biológicos. Esses são medicamentos mais sofisticados, que bloqueiam a reação química da inflamação, e com eles a gente consegue interromper o processo inflamatório com segurança. Devem ser prescritos de acordo com vários critérios. Quem é habilitado para tratar a AIJ é o especialista em reumatologia pediátrica”, afirma. Contudo, ainda são poucos médicos no Brasil com essa especialidade. Na falta dele, recomenda-se buscar um reumatologista de adultos, mas sem deixar de lado a avaliação do pediatra.
O tratamento ideal ultrapassa o campo da Medicina. Muitos pacientes precisam fazer reabilitação com fisioterapeuta e terapeuta ocupacional, além de seguir acompanhamento psicológico, pois o impacto emocional pode ser muito grande, tanto para a criança quanto para a família.
Também é essencial que a criança se mantenha ativa e realize atividade física regular para promover a inclusão social e a melhora na qualidade de vida. Daniela. Embora pareça contraintuitivo, o movimento ajuda a restaurar e manter a função articular, além de evitar deformidades e incapacidades na articulação acometida.