Como o isolamento impacta quem sofre com ansiedade ou depressão

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O Sars-CoV-2, vírus causador da Covid-19, definitivamente não atinge apenas quem contrai a doença causada pelo novo coronavírus. Até que uma vacina ou medicamento seja desenvolvido, o método mais eficaz encontrado pelas autoridades para combater a disseminação do vírus é o combo medidas de higiene e distanciamento social — que, sim, salva muitas vidas, mas também atrapalha a saúde emocional de muita gente. Claro que ficar longe do trabalho, dos amigos e até mesmo de familiares impacta todo mundo. “Esse é um período de luto coletivo em que é preciso ressignificar as necessidades e os valores da vida. Isso vem associado à angústia da incerteza financeira e ao medo da contaminação”, analisa o psicanalista Ronaldo Coelho, do canal Conversa Psi, no YouTube. Sem contar que a ansiedade, quando controlada, é um mecanismo de reação diante de situações de perigo, funcionando como um estado de alerta para que a pessoa saiba como agir.

No Brasil, o cenário também é preocupante

Por aqui, 11,5 milhões de pessoas sofrem com problemas de depressão, de acordo com dados apresentados em 2017 pela Organização Mundial da Saúde (OMS). E a pandemia pode aumentar ainda mais esse contingente. Uma pesquisa com 1.460 brasileiros, coordenada pelo psicólogo Alberto Filgueiras, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), mostra que os sintomas de ansiedade e depressão duplicaram no país em apenas um mês de quarentena. Na primeira semana do estudo, entre 18 e 22 de março, a prevalência de sintomas de ansiedade e depressão entre os participantes era de 4,2%; já entre 15 e 20 de abril, esse índice subiu para 8%. O estudo aponta também que os grupos com saúde mental mais frágil são as pessoas que precisam sair de suas casas para trabalhar, aqueles que convivem com idosos e também quem mudou hábitos alimentares e físicos repentinamente. A boa notícia é que dá para adotar medidas que ajudem a minimizar ou mesmo prevenir a situação. “Foi possível verificar que aqueles que mantêm uma alimentação saudável, fazem terapia online e praticam exercícios físicos de três a quatro vezes por semana são menos propensos a ter sintomas de ansiedade e depressão”, afirma Filgueiras.

Situação financeira pode ser um agravante

O problema é quando essas condições emocionais saem do controle: nesses casos, a situação de isolamento social pode ser pior ainda. Aqueles que já sofrem com transtornos como depressão, bipolaridade e ansiedade crônica percebem a solidão e as tensões causadas pela pandemia de forma muito mais intensa. Um estudo preliminar (que ainda não foi revisado por outros pesquisadores antes da publicação) das universidades Swansea e de Manchester, ambas no Reino Unido, feito com britânicos maiores de 18 anos de idade, alerta para um aumento significativo dos sentimentos de ansiedade e depressão durante a pandemia de Covid-19, especialmente entre aqueles em situação financeira ou social mais vulnerável.

O isolamento pode aumenta índices de suicídio

Outro artigo, este publicado no último dia 10 de abril no respeitado periódico Jama Psychiatry, alerta que o isolamento pode aumentar os índices de suicídio. Segundo os autores, vinculados a universidades e instituições de saúde norte-americanas, diversas teorias enfatizam o papel das relações sociais na prevenção do suicídio. “Pensamentos e comportamentos suicidas são associados a isolamento social e solidão”, escrevem os pesquisadores. Ficar longe de tudo e de todos, portanto, pode ser ainda mais perigoso para pessoas sob risco de tirarem a própria vida.

Sintomas da depressão

– Alterações de apetite (perda ou ganho de peso),
– Perda de interesse por atividades que lhe dava prazer,
– Alterações de sono (insônia ou excesso de sono),
– Diminuição da autoestima, descuidando da sua aparência,
– Cansaço, fadiga e perda de energia,
– Aparecimento de sentimentos de tristeza, angústia, ansiedade e mesmo de irritabilidade,
– Pensamentos recorrentes de morte ou suicídio,
– Dores pelo corpo, queda da imunidade, o– Perda recente do interesse por sexo,
– Dificuldade de concentração, memória e raciocínio,
– Diminuição da capacidade de sentir alegria.

Atenção especial aos idosos

A depressão já era um transtorno mental frequente entre idosos, agora com a pandemia do coronavírus, a tendência é que este número se eleve. As incertezas frente ao futuro, mudanças repentinas na rotina e a redução do contato físico e social com familiares e amigos podem ser fatores geradores de uma sobrecarga emocional, que ultrapassa a capacidade de enfrentamento de qualquer indivíduo, independente da faixa etária. Idosos são particularmente mais vulneráveis aos efeitos prejudiciais da Covid-19 pois, além de ser o grupo de maior risco, sofrem diretamente os efeitos do isolamento e distanciamento social, uma vez que a recomendação é de que fiquem em casa. Sabe-se também que este será um dos últimos grupos a retomar a normalidade. Nas últimas décadas houve um crescente incentivo a esta parcela da população para que saísse de suas casas, frequentassem grupos de idosos, fossem fazer atividades que lhes dessem prazer. Eles sentiram o gosto deste protagonismo e a liberdade proporcionada, aprenderam a se valorizar e viver de uma forma mais plena. Eis que chega este vírus e a orientação agora é justamente ao contrário, fique em casa! As relações sociais, que sempre foram fatores protetivos a sua saúde mental agora são restritas a ligações e vídeo chamadas, na sua maioria. Para muitas pessoas não está sendo fácil a adaptação a esta nova realidade, porém lutar contra ela pode não ser a atitude mais inteligente. Precisamos cultivar a cautela, paciência e sabedoria, características essas que muitos idosos tem de sobra, afinal tiveram longos anos de vida os quais passaram por diversas dificuldades, que de uma forma ou de outra, sempre saíram exitosos.

Pelo bem do corpo e da mente

Desenvolver um quadro depressivo requer orientação profissional e, muitas vezes, medicamentos específicos. Mas há atitudes que também podem ajudar. O psiquiatra Luiz Alberto Hetem, idealizador do PQU Podcast, lembra que o distanciamento físico não necessariamente significa isolamento. “Conectar-se com amigos e familiares ajuda a afastar a sensação de mal-estar”, diz. Fazer exercícios físicos, manter uma rotina diária e adotar hábitos simples, como tirar o pijama ao acordar, são outras boas práticas para a saúde mental. Procure também selecionar os horários em que acompanha as notícias. “Ao mesmo tempo que é importante manter-se informado, é preciso cautela com a quantidade de informações”, afirma Hetem. Baseie-se em fontes confiáveis, que garantam que a aquela notícia não é puro alarmismo.

Saiba onde procurar ajuda?

Diversas instituições fornecem ajuda a quem se sente angustiado e necessita de orientação profissional. O Centro de Valorização da Vida (CVV) é uma delas: a rede realiza atendimentos gratuitos de apoio emocional e prevenção ao suicídio. Há a garantia de sigilo e o acesso se dá via email e chat 24 horas. Hoje há também diversas empresas que oferecem serviço de terapia online. O Instituto Vita Alere lançou, com apoio do Google, um mapa da saúde mental que funciona como um guia ao mostrar informações úteis para quem procura atendimento online durante a pandemia. No mapa, é possível encontrar profissionais e grupos de apoio disponíveis virtualmente.