Apesar do agravante da crise na educação estadual, professores relatam a importância e os desafios da profissão

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Greve na educação estadual já perdura há mais de 60 dias

O Governo de José Ivo Sartori ao longo de mais de dois anos já parcelou mais de 20 vezes os salários dos servidores públicos estaduais. Os professores, uma das classes afetadas pela medida, ao longo desse tempo fizeram protestos exigindo o pagamento integral, porém, pouco adiantou. Mesmo com a crise no governo e a falta de incentivo e valorização com os educadores, a profissão ainda é desejada por muitas pessoas que sonham em seguir carreira na sala de aula.
A professora Caroline Nardin, 31 anos, leciona desde os 17 anos. Mestre em história, trabalhou por mais de dez anos no Estado com história e sociologia. Desde que começou o parcelamento dos salários no Estado, começou a trabalhar pelo município. Carol, como é conhecida por amigos, afirma que a escolha da profissão foi influenciada pela mãe. “Fiz magistério por causa da minha mãe (Ivone Nardin) que é professora. Sempre trabalhei na área da educação, não saberia fazer outra coisa. Apesar das dificuldades encontradas na profissão, eu amo o que eu faço”, afirma.
Carol que está sempre buscando novos desafios na carreira começou a cursar Pedagogia, e o motivo é nobre. A jovem professora está trabalhando apenas com crianças, apesar de admitir saudades de ensinar para adolescentes. “O professor não deve trabalhar por amor, mas sim, com amor e trabalhar com crianças é maravilhoso, sentir o carinho delas, a motivação em aprender coisas novas. Tenho saudade dos adolescentes, dos debates, da troca de sugestões de livros”, recorda.
Ainda segundo a educadora, ser professor é desafiador, uma profissão que deve ser exercida com amor. “Eu amo ser professora, quero fazer isso a minha vida toda. Acho que para ser professor tem que gostar muito , pois não é fácil , trabalhamos muito em casa também”, conta.

Professora, mãe e dona de casa
Rosemari Dallagnol é professora há mais de 14 anos, e segundo ela, pela remuneração no magistério não ser atraente, sempre exerceu outros ofícios paralelos a profissão de professora. “Eu estudava contábeis, mas em Bento era oferecido o curso de Letras, então comecei a cursar. sempre trabalhei com outra profissão paralela a de professor pois a remuneração sempre foi muito baixa na área do magistério”, conta. Mãe de um universitário, ela depende de seu trabalho para ajudar o filho, além das próprias despesas.
“No momento que estou somente com esta fonte de renda é muito difícil manter as despesas com a renda. Não é novidade para ninguém o parcelamento dos salários e o baixo valor recebido. Este é um desafio é tanto para o professor se manter na área”, acredita.
Para Rosemari a realidade da carreira de professor do Estado é ainda mais complicada para quem mora em cidade fora da Serra Gaúcha. “Muitos colegas, principalmente nessa região não dependem apenas deste salário para sustentar a casa, mas fora da Serra a situação é terrível, já que os professores não têm dinheiro para pagar o transporte para ir a escola. Eu dependo dessa renda para manter a casa, filho na universidade, então dá para imaginar o desafio”, desabafa.
Ainda de acordo com Rosemari, outro desafio é a falta de valorização por parte da sociedade. “No meu ver algumas pessoas não reconhecem a importância do professor, não percebem que é o pilar de todas as profissões”, diz.

Paula se formou, mas não seguiu a carreira
A estudante Paula Giacobbo, de 26 anos, se graduou em Letras em 2014, porém, não exerce a profissão. Os motivos que a levaram deixar a profissão é pela preferência em trabalhar com revisão e tradução. Mesmo assim, Paula acredita que a educação precisa melhorar em diversos sentidos, não penas no colégio.
“São comuns casos em que os alunos têm comportamentos ruins em sala de aula, porque sofrem com algum problema onde moram. Acredito que projetos que auxiliam as famílias desses alunos a terem melhores condições de vida, acompanhamento psicológico, entre outros, também são formas de investir na educação”, diz, acrescentando que já se sentiu desrespeitada “em vezes em que pedi para os alunos sentarem e pararem de conversar e não fui atendida, mas apenas nesse sentido”, ainda quando fez o estágio obrigatório.
Ainda segundo a estudante, falta valorização com o educador por parte da sociedade. “O professor deveria ser mais valorizado e ter um salário melhor. O modo como as pessoas agem e pensam é reflexo da educação que recebem, e os professores têm um papel fundamental nessa formação. Além disso, quando não estão em aula, estão corrigindo provas e trabalhos ou planejando as próximas aulas. Merecem muito mais do que recebem. Acredito também que os alunos em geral se sentem mais motivados se estão diante de professores motivados”, afirma.

O amor por ensinar
A professora Adriana Prohnoski, de 41 anos, leciona há pelo menos 21 anos. Formado em Letras, tem pós-graduação em gestão esoclar. Já atuou como diretora e vice-diretora de escola, classificado por ela como anos desafiadores. Sua maior paixão é estar em sala de aula com crianças das séries iniciais.
A vontade de ensinar surgiu ainda na infância, quando tinha apenas 9 anos. “Sempre gostei de ensinar. Quando criança brincava com minha irmã menor de “escolinha”, eu era a profe e ela a aluna, desenhava e escrevia nas portas lá de casa (risos). Anos mais tarde decidi que esta seria minha profissão. Gosto muito de trabalhar com os pequenos e ver seu progresso na aprendizagem. O brilho no olhar quando aprendem algo novo é encantador”, se emociona.
Para Adriana um dos maiores desafios da profissão é concorrer com o mundo digital. “Nossos alunos são bombardeados por informações, fazem muitas atividades ao mesmo tempo e se tornaram imediatistas, querem tudo para ontem, e na escola o conhecimento tem que ser construído, assim apresentam dificuldades em se concentrar nas explicações e atividades. Então, nós professores temos que estar sempre criando novas estratégias para chamar a atenção destes alunos”, afirma.

Procura no Magistério cai
De acordo com a diretora da Escola Estadual Cecília Meireles, Marilei Anderle, nos últimos cinco anos, o número de alunos que cursam magistério tem diminuído. “A gente costumava ter turmas com 25, 30 alunos e hoje temos uma média de 12 a 20 alunos no máximo”, relata.
Mas ela não atribui a queda apenas à desilusão com a profissão de professor. “O que a gente percebe é que cada vez mais os jovens entram no ensino médio sem ter claro o que eles querem para o seu futuro. E essa falta de clareza no fim do ensino fundamental faz com que eles acabem não optando pelo Magistério. A gente tem muitos alunos que fazem o ensino médio e depois seguem carreira na Pedagogia”, conta.
Para a diretora, o magistério é uma formação pré-pedagógica e que auxilia na formação do pedagogo. “Alunos relatam que ter feito o magistério é um diferencial para quem seguiu na área. Escuto isso também de professores”, relata, acrescentando que o magistério poderia ser um pré-requisito para Pedagogia. Ao fazer o curso, o único em Bento Gonçalves, o estudante sai apto para lecionar.

Sindicato de professores decidiram manter greve no Estado
A greve dos professores estaduais, que teve início em setembro, já dura mais de 60 dias e ainda não tem previsão de acabar. Em assembleia realizada na última sexta-feira (10), o sindicato dos professores do Rio Grande do Sul (Cpers) decidiram pela continuidade da paralisação da categoria.
A votação foi realizada com voto em urna. Dos educadores votantes, 1160 decidiram pela continuidade da greve e 578 pela suspensão
O coordenador da CRE de Bento Gonçalves, no entanto, afirma que a procura por vagas por parte dos educadores tem se mantido de forma positiva. “Apenas este ano foram 1040 inscrições de professores para atuarem em escolas da região. Eu considero um número bom, e no meu ver, pode ter diminuído mais a procura em universidades”, acredita.

Pesquisa mostra queda no interesse por cursos de licenciatura
Uma pesquisa do Sindicato das Mantenedoras de Ensino Superior (Semesp) mostrou que o número de alunos que ingressaram em cursos de licenciatura presenciais caiu 10% entre 2010 e 2016. No mesmo período, o número de concluintes desses cursos caiu 7,6%. Segundo o estudo, 39,5% dos formandos em licenciatura estão trabalhando na sua área de atuação. No âmbito geral, a pesquisa mostra que 47% dos alunos que concluíram a graduação estão trabalhando em sua área de formação. Outros 18,7% trabalham em uma área diferente da que se formaram e 34,3% não estão trabalhando. O estudo registrou um aumento no número de concluintes com renda inferior a três salários mínimos. No caso de estudantes na faixa de até 1,5 salário mínimo, o aumento foi 4,7 pontos percentuais e para alunos com renda entre 1,5 e 3 salários, houve crescimento de 3,4 pontos.